OSAKA, Japão — Pressionado pela oposição democrata e a imprensa a adotar uma atitude mais crítica em relação a Vladimir Putin por causa da interferência russa na campanha eleitoral de 2016, o presidente Donald Trump finalmente fez isso, mas a seu modo.
Durante um encontro bilateral com Putin à margem da cúpula do G-20 no Japão, Trump foi questionado por um jornalista a respeito de quando pretendia dizer a Putin para não interferir na eleição do ano que vem. Com um meio sorriso, tom jocoso e o dedo indicador apontado ironicamente para Putin, Trump reagiu:
— Não se meta nas eleições, presidente.
Em seguida, o presidente americano se virou para um funcionário russo que acompanhava o encontro e repetiu:
— Não se meta nas eleições.
Foi o primeiro encontro de Trump e Putin após a conclusão do relatório da investigação do procurador especial Robert Mueller sobre a interferência russa em 2016. No relatório, Mueller afirma que a Rússia realizou uma operação "radical e sistemática" em favor da eleição do republicano, por meio da ação de trolls nas redes sociais e da invasão dos computadores da campanha da democrata Hillary Clinton. O procurador diz, porém, que não há provas de cumplicidade da campanha de Trump na operação.
Quando o relatório foi apresentado, o presidente americano comemorou o resultado como uma vitória, dizendo que "não houve conluio". Putin nega veementemente qualquer intervenção de Moscou nas eleições americanas, dizendo que houve uma "interferência mítica":
— A Rússia foi e, por mais estranho que isso pareça, continua a ser acusada de uma interferência mítica nas eleições americanas — disse Putin ao Financial Times, em entrevista publicada na quinta-feira. — Na verdade, o que aconteceu foi que Trump observou a atitude de seus oponentes, viu mudanças na sociedade americana e tirou vantagem disso.
Na entrevista ao FT, Putin se alinhou ao populismo nacionalista defendido pelo colega americano e que emerge em países europeus como a Itália e a Hungria. Ele elogiou a política migratória linha-dura de Trump e chamou o liberalismo político de "obsoleto":
— Essa ideia liberal pressupõe que nada precisa ser feito. Que os imigrantes podem matar, roubar e estuprar com impunidade porque seus direitos como imigrantes devem ser garantidos — disse Putin. — Todo crime deve ser punido. Esse liberalismo se tornou obsoleto e entrou em conflito com os interesses de uma grande maioria da população.
O presidente russo ainda criticou a alemã Angela Merkel por ter aberto as portas aos refugiados sírios:
— Eles (os liberais) não podem ditar mais nada para ninguém, como têm feito nas últimas décadas — disse, chamando a decisão de Merkel de "erro fundamentall".
Frente contra jornalistas
Na reunião bilateral, Trump e Putin mantiveram um tom amigável, sorrindo e conversando. Enquanto eram fotografados, os líderes encontraram outro ponto em comum nas suas críticas a jornalistas:
— Livre-se deles. Fake news é uma ótima expressão, não é? Vocês não têm esse problema na Rússia, mas nós temos — disse Trump.
Em inglês, Putin respondeu:
— Nós também temos. É a mesma coisa.
Um comunicado da Casa Branca disse, sem maiores detalhes, que os dois conversaram sobre o Irã, a Síria, a Venezuela e a Ucrânia.
— É uma grande honra estar com o presidente Putin — disse Trump. — Nós temos uma relação muito, muito boa e esperamos ter outros bons momentos juntos. Muitas coisas positivas irão surgir desse relacionamento.
Ainda nesta sexta, Trump se encontrou com Jair Bolsonaro e com a chanceler Angela Merkel. Trump interrompeu brevemente as conversas com a líder alemã para comentar a segunda noite de debates entre os pré-candidatos do Partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos:
— Eles definitivamente têm muitos candidatos. Eu estou ansioso para me encontrar com você ao invés de assistir a isso — disse Trump a Merkel, que não demonstrou reação ao ouvir o comentário sobre a política interna americana.