Por Laís Modelli, Lara Pinheiro, Lucas Sampaio e Mariana Garcia, G1


Compare: o que Pazuello falou na CPI e o que disse quando estava no Ministério da Saúde

Compare: o que Pazuello falou na CPI e o que disse quando estava no Ministério da Saúde

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello é ouvido pelo segundo dia seguido nesta quinta-feira (20) na CPI da Covid no Senado.

Compare abaixo as declarações de Pazuello no primeiro dia com o que ocorreu em sua gestão à frente do Ministério da Saúde sobre os seguintes temas:

  • Autonomia e compra da CoronaVac
  • Defesa do isolamento social
  • Execução de ações de saúde
  • Oxigênio em Manaus
  • Aplicativo TrateCOV

Autonomia e compra da CoronaVac

DECLARAÇÕES NA CPI: Pazuello afirmou durante o depoimento que "nunca foi desautorizado" por Bolsonaro e "nunca o presidente da República mandou eu desfazer qualquer contrato".

"Em momento algum o presidente da República me orientou ou me encaminhou ou me deu ordem para fazer nada diferente do que eu já estava fazendo. Nada. Absolutamente nada. [...] As minhas posições e as minhas ações nunca foram contrapostas pelo presidente. [...] Em nenhum momento o presidente me desautorizou ou me orientou a fazer qualquer coisa diferente do que eu estava fazendo", declarou o ex-ministro (veja no vídeo abaixo).

Depois, o ex-ministro voltou ao assunto e afirmou: "Acreditem: nunca o presidente da República mandou eu desfazer qualquer contrato, qualquer acordo com o Butantan. Nenhuma vez."

VÍDEO: "As minhas posições não eram contrapostas pelo presidente", afirma Pazuello

VÍDEO: "As minhas posições não eram contrapostas pelo presidente", afirma Pazuello

ATOS NO MINISTÉRIO: Em outubro, o então ministro anunciou protocolo de intenção de compra de 46 milhões de doses da CoronaVac, produzida pelo Instituto Butantan em parceria com a Sinovac.

Um dia depois, Bolsonaro afirmou que o governo federal não iria adquirir "vacina da China": "Ele [Pazuello] tem um protocolo de intenções, já mandei cancelar se ele assinou. Já mandei cancelar. O presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade. Até porque estaria comprando uma vacina que ninguém está interessado por ela, a não ser nós".

O ministério, então, voltou atrás e disse que "não há intenção de compra de vacinas chinesas". Depois, Pazuello participou de uma transmissão ao vivo ao lado do presidente — ambos sem máscara — e afirmou que "senhores, é simples assim: um manda e o outro obedece" (veja no vídeo abaixo).

O vídeo abaixo, de outubro, mostra que a compra da CoronaVac virou objeto de disputa política e que o presidente Jair Bolsonaro desautorizou a compra do imunizante após o anúncio feito por Pazuello:

Bolsonaro desautoriza Pazuello e suspende compra da CoronaVac, em outubro de 2020

Bolsonaro desautoriza Pazuello e suspende compra da CoronaVac, em outubro de 2020

Defesa do isolamento social

DECLARAÇÃO NA CPI: Pazuello afirmou na CPI da Covid que sempre defendeu isolamento social.

"Eu sempre sempre me posicionei da mesma forma: medidas preventivas, incluindo aí o distanciamento social necessário em cada situação. Essa era a minha posição em todas as nossas ações de comunicação", afirmou o ex-ministro (veja no vídeo abaixo).

VÍDEO: "Eu sempre me posicionei da mesma forma: medidas preventivas", afirma Pazuello

VÍDEO: "Eu sempre me posicionei da mesma forma: medidas preventivas", afirma Pazuello

ATOS NO MINISTÉRIO: Em maio de 2020, o então ministro interino foi alertado pelo comitê técnico da pasta que, sem isolamento social efetivo, o país poderia levar até dois anos anos para controlar a pandemia (veja no vídeo abaixo).

Ao contrário do alerta, Pazuello orientou a reabertura das atividades econômicas e, três semanas depois da reunião, o ministério publicou uma portaria sobre o retorno das atividades, enfatizando seus benefícios.

Na mesma época, Bolsonaro também defendeu a manutenção dessas atividades. "O governo federal, se depender de nós, estava tudo aberto com isolamento vertical e ponto final", afirmou o presidente.

O vídeo abaixo, de julho, mostra que Pazuello não seguiu orientação dada em maio de 2020 por comitê técnico, que sugeriu isolamento social, e orientou para a reabertura econômica:

Ministro interino da Saúde foi alertado, em maio de 2020, para a importância do isolamento social, mas orientou pela retomada de atividades econômicas

Ministro interino da Saúde foi alertado, em maio de 2020, para a importância do isolamento social, mas orientou pela retomada de atividades econômicas

Execução de ações de saúde

DECLARAÇÃO NA CPI: Pazuello afirmou que "não há possibilidade de o Ministério da Saúde interferir na execução das ações de estado da saúde sem usurpar competências dos estados e municípios. Isso seria possível no caso de intervenção federal em algum estado".

VÍDEO: "A União disponibiliza recursos para que estados e municípios executem ações de saúde", diz Pazuello

VÍDEO: "A União disponibiliza recursos para que estados e municípios executem ações de saúde", diz Pazuello

ATOS DO MINISTÉRIO: Em 7 de maio de 2021, a secretária da Gestão do Trabalho e da Educação da Saúde do ministério, Mayra Pinheiro, afirmou que visitou Manaus em janeiro para difundir o uso de cloroquina entre médicos da capital amazonense.

Pinheiro integrou a equipe do governo federal que visitou unidades de saúde em Manaus pouco antes do colapso na saúde pública do Amazonas, no mesmo mês, que levou mais de 30 pessoas a morrerem por falta de oxigênio.

A secretária afirmou, em depoimento ao Ministério Público Federal (MPF), que o objetivo da missão da equipe era orientar os colegas médicos (veja no vídeo abaixo).

Entre as recomendações estava o uso de cloroquina e hidroxicloroquina para tratar a Covid-19. Tanto a cloroquina como a hidroxicloroquina já tiveram sua ineficácia comprovada em diversos estudos científicos.

O vídeo abaixo, de 7 de maio, mostra trecho do depoimento de Mayra Pinheiro ao MPF, no qual ela fala sobre conversas com médicos em relação ao chamado tratamento precoce e orientações referentes à prescrição de medicamentos como cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina:

Mayra Pinheiro em depoimento ao MPF

Mayra Pinheiro em depoimento ao MPF

VEJA TAMBÉM:

Oxigênio em Manaus

DECLARAÇÃO NA CPI: Pazuello disse que ficou sabendo da crise em Manaus no dia 10 de janeiro.

“Fiquei sabendo no dia 10 [de janeiro] à noite, em uma reunião com o governador [do Amazonas] e secretário de Saúde", disse o ex-ministro. "Chegamos no dia 10, no dia 11 abrimos o Centro Integrado de Coordenação e Controle e, na sequência, no dia 12, começaram a chegar as aeronaves trazendo mais oxigênio".

Nesta quinta-feira (20), no segundo dia de depoimento, Pazuello voltou a falar sobre o assunto e negou ter ficado sabendo da falta de oxigênio no dia 7, atribuindo a informação a um "erro de servidor". "Errou na análise do protocolo" e "já assumiu o erro".

"Eu tive conhecimento no dia 10 à noite de que o risco logístico poderia trazer problemas graves de oxigênio. Isso [informação do dia 7] foi um erro de um servidor. Ele confundiu a Secretaria de Saúde do Amazonas", afirmou o ex-ministro.

ATOS NO MINISTÉRIO: Entre janeiro e fevereiro, o Ministério da Saúde mudou por três vezes a data em que foi informado sobre o colapso de oxigênio em Manaus: dias 8, 10 e 17 de janeiro.

Em depoimento à Polícia Federal em Brasília, no dia 4 de fevereiro, Pazuello afirmou que não foi informado sobre a falta de oxigênio em Manaus no dia 8 de janeiro, e sim dois dias depois, no dia 10, na véspera da viagem que fez a Manaus. O fornecimento de oxigênio hospitalar entrou em colapso na cidade nos dias 14 e 15 de janeiro.

A versão contradiz um documento oficial entregue pela Advocacia-Geral da União (AGU) ao Supremo Tribunal Federal (STF), assinado pelo advogado-geral, José Levi. Ele afirmou que o Ministério da Saúde ficou sabendo da falta de oxigênio em Manaus no dia 8, pela White Martins.

O depoimento de Pazuello fazia parte do inquérito da PF sobre a crise em Manaus, que apura se houve omissão do ministro no caso (veja no vídeo abaixo).

Em entrevista coletiva no dia 18 de janeiro, o então ministro mudou a versão inicial e disse que foi avisado pela empresa fornecedora no dia 8 de janeiro. Em 28 de janeiro, o Ministério da Saúde mudou a data novamente. Em documento com pedido de retificação enviado ao STF, Pazuello afirmou que só foi informado no dia 17 de janeiro.

O vídeo abaixo, de 26 de janeiro, explica o inquérito da PF que investiga Pazuello sobre a crise em Manaus e apura uma possível omissão do ex-ministro, por exemplo, na demora para enviar oxigênio e representantes do governo federal à capital amazonense:

STF autoriza investigação de Pazuello por colapso em Manaus: entenda o caso

STF autoriza investigação de Pazuello por colapso em Manaus: entenda o caso

Aplicativo TrateCOV

DECLARAÇÃO NA CPI: Pazuello disse que o aplicativo TrateCOV nunca entrou em operação. Segundo ele, a plataforma era um protótipo para "facilitar o diagnóstico clínico feito pelo médico".

"Essa plataforma foi mostrada no dia 11, em Manaus, em desenvolvimento. Era um protótipo e não foi distribuída aos médicos", disse Pazuello. Segundo ele, quem determinou o uso da plataforma foi a secretária da Gestão do Trabalho e da Educação da Saúde do ministério, Mayra Pinheiro.

“Quem determinou foi a secretária Mayra. Ela me trouxe como sugestão, quando voltou de Manaus no dia 6 de janeiro, que poderia utilizar um aplicativo, uma plataforma que já é desenvolvida para isso, para facilitar o diagnóstico clínico feito pelo médico. E que ela iria iniciar esse trabalho para fechar essa plataforma", disse o ex-ministro.

VÍDEO: Eduardo Pazuello afirma que 'aplicativo TrateCov nunca entrou em operação'

VÍDEO: Eduardo Pazuello afirma que 'aplicativo TrateCov nunca entrou em operação'

ATOS NO MINISTÉRIO: No dia 11 de janeiro, durante um evento em Manaus, o Ministério da Saúde lançou o aplicativo TrateCOV. O lançamento da plataforma foi noticiado pela TV Brasil.

Segundo a pasta, o TrateCOV era "uma plataforma de auxílio que trabalha a coleta de sintomas e sinais de pacientes, permitindo que médicos possam estabelecer, com maior segurança e rapidez, o diagnóstico e optar, conforme sua autonomia profissional, ao tratamento mais adequado".

Na época, o então ministro defendeu o chamado tratamento precoce. "O diagnóstico não é do teste, é do profissional médico. O tratamento, a prescrição, é do médico. E a orientação é precoce. E essa é a orientação de todos os conselhos de medicina", disse Pazuello.

Comunicado interministerial resume lançamento do aplicativo TrateCov. — Foto: Divulgação/Arte G1

A pasta explicou, em janeiro, que Manaus tinha sido escolhida para estrear o TrateCOV e que 342 profissionais já haviam sido habilitados para utilizar a plataforma.

O G1 acessou a plataforma, que recomendava o "tratamento precoce" com medicamentos ineficazes contra a Covid-19, como cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina.

Segundo especialista ouvido na época, o código do aplicativo parecia programado para recomendar o uso dos medicamentos aos pacientes independentemente de alguns dos campos preenchidos. A plataforma saiu do ar em 21 de janeiro.

Página do Ministério da Saúde cita o lançamento do TrateCov — Foto: Reprodução/Arte G1

Compra de hidroxicloroquina

DECLARAÇÃO NA CPI: Pazuello disse no depoimento: "Não comprei nenhum comprimido de hidroxicloroquina".

VÍDEO: 'Eu não comprei nenhum comprimido de hidroxicloroquina', afirma Eduardo Pazuello

VÍDEO: 'Eu não comprei nenhum comprimido de hidroxicloroquina', afirma Eduardo Pazuello

ATOS NO MINISTÉRIO: Em 24 de julho de 2020, A TV Globo teve acesso às atas de reuniões do Comitê de Operações de Emergência do Ministério da Saúde realizadas entre abril e junho. No dia 25 de maio, o comitê discutiu longamente a compra de cloroquina.

Relembre na reportagem abaixo, de 24/7/2020

Pazuello despreza recomendação do Ministério da Saúde para não comprar mais cloroquina

Pazuello despreza recomendação do Ministério da Saúde para não comprar mais cloroquina

A ata da reunião revela que o governo decidiu trazer 3 toneladas de insumo farmacêutico ativo para o Brasil. Mas logo abaixo, no mesmo documento, os técnicos alertaram: "Devido à atual situação, não é aconselhável trazer uma quantidade muito grande, pois, caso o protocolo venha a mudar, podemos ficar com um número em estoque parado para prestar contas". Mesmo assim, o governo manteve os planos.

De acordo com a ata de outra reunião, em 3 de julho, pouco mais de um mês depois, o Ministério da Saúde já tinha mais de 4 milhões de comprimidos de cloroquina em estoque. O documento seguiu afirmando, que "alguns estados não quiseram receber a cloroquina, com isso ficou em estoque para devolução mais de 1,4 milhão comprimidos".

A essa altura, a OMS já havia anunciado que a cloroquina não tinha eficácia comprovada e podia provocar efeitos colaterais. Cientistas de várias organizações de renome também já haviam chegado à mesma conclusão. E países como França, Bélgica, Itália, Portugal e Reino Unido suspenderam, proibiram ou deixaram de recomendar o remédio.

Dados da Covid no Brasil

DECLARAÇÃO NA CPI: Questionado sobre os dados da pandemia no Brasil, Pazuello respondeu: "Não está escondido. Nunca foi escondido (o número de óbitos pela Covid-19)"

ATOS NO MINISTÉRIO: Primeiro, o horário de divulgação do número de mortes por Covid-19 pelo ministério, que era às 17h na gestão do ministro Luiz Henrique Mandetta (até 17 de abril de 2020), passou para as 19h e depois para as 22h na gestão Pazuello, dificultando ou inviabilizando a publicação dos dados em telejornais e veículos impressos. “Acabou matéria no Jornal Nacional”, disse o presidente Jair Bolsonaro, em tom de deboche, ao comentar a mudança.

Relembre no VÍDEO abaixo

'Acabou matéria do Jornal Nacional', diz Bolsonaro sobre atrasos na divulgação de dados

'Acabou matéria do Jornal Nacional', diz Bolsonaro sobre atrasos na divulgação de dados

Depois, houve uma alteração de caráter qualitativo. O portal onde o ministério colocava o número de mortos e contaminados foi retirado do ar na noite do dia 4 de junho do ano passado. Quando retornou, depois de mais de 19 horas, passou a apresentar apenas informações sobre os casos “novos”, ou seja, registrados no próprio dia. Desapareceram os números consolidados e o histórico da doença desde seu começo. Também foram eliminados do site os links para downloads de dados em formato de tabela, essenciais para análises de pesquisadores e jornalistas, e que alimentavam outras iniciativas de divulgação.

Entre os itens que deixaram de ser publicados estavam:

  • curva de casos novos por data de notificação e por semana epidemiológica;
  • casos acumulados por data de notificação e por semana epidemiológica;
  • mortes por data de notificação e por semana epidemiológica;
  • e óbitos acumulados por data de notificação e por semana epidemiológica.

No dia 7, o governo anunciou que ia voltar a informar seus balanços sobre a doença. Mas mostrou números conflitantes, divulgados no intervalo de poucas horas. Em razão de todas essas omissões, inclusive, veículos de comunicação anunciaram uma parceria inédita para coletar os números. Desde então, os veículos apuram os dados diretamente nas secretarias estaduais de Saúde, divulgando diariamente o resultado desse acompanhamento em seus respectivos canais. O Ministério da Saúde só voltou a divulgar os dados completos dias depois, obedecendo a uma ordem do STF.

Neste ano, o ministério voltou a causar polêmica ao alterar a ficha dos pacientes no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe), sem dar tempo para que municípios e estados se preparassem, impactando na divulgação dos óbitos, exatamente um dia após o Brasil registrar um recorde. Pressionado, porém, o órgão voltou atrás da decisão.

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