Os escrachos e a luta por verdade e justiça "desde baixo"
Inês Virginia Prado Soares1
Renan Honório Quinalha2
(...) e tinha justiça nesse escarrar.
Chico Buarque de Hollanda – Não sonho mais.
(...) Me acuerdo bien
y le doy las gracias a mi memoria
no voy a ser
tan tarado de repetir la historia
de darle un voto
a los que te mienten y te saquean
y ahora se quejan
porque en la calle los reputean
Y qué esperaban?
Que los aplaudan?
Que los alienten
con palmaditas sobre la espalda?
Y qué esperaban?
Un monumento?
No haría falta
porque su cara ya es de cemento
Mientras acá... sopla otro viento
y Ustedes tiemblan
al ver los barrios en movimiento
Con sus colegas
sus asesores y sus parientes
se repartieron
lo que le falta hoy a tanta gente
Su dignidad
quedó sepultada adentro de un sobre
y ahora se asustan
viendo en la marcha a miles de pobres
Y qué esperaban?
Que los abracen?
Alfombras rojas y
una ovación cuando
Ustedes pasen
Y qué esperaban, sus Majestades?
Que los reciban
con pompa y fuegos artificiales? (...)
Ignacio Copani –Escrache
1. Introdução
1
Mestre e Doutora em Direito pela PUC/SP. Realizou pesquisa de Posdoutorado no Núcleo de Estudos da
Violência da USP. Procuradora Regional da República. Membro do IDEJUST.
2
Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo. Doutorando em Relações Internacionais pela USP e
assessor da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”. Membro do IDEJUST.
Depois de período de graves e sistemáticas violações de direitos humanos, decorrentes
de regimes autoritários ou de conflitos civis, há uma série de obrigações internacionais que vinculam o Estado a promover a reparação, em sentido amplo, das violências cometidas.
Nesse artigo, nossa intenção é examinar diferentes maneiras de atuação de movimentos sociais e de outros atores da sociedade civil na luta concreta da busca por verdade e justiça
na arena brasileira, chamando atenção para uma dimensão sociológica geralmente negligenciada
nos estudos tradicionais e mais formalistas da justiça de transição.
Evidentemente, o ponto de vista "desde baixo", que ora adotamos como perspectiva
para a análise, diferencia-se de um olhar que confere maior destaque às instituições públicas estatais, mas não ignora ou exclui a importância destas na consecução de uma agenda transicional
mais abrangente e profunda.
Quando o assunto é direitos humanos, a despeito de haver expressa regulamentação
sobre a matéria, a falta de incentivos (de um ponto de vista utilitário tão adotado pelos governos
nacionais) e o déficit de enforcement para o cumprimento dos direitos humanos servem de álibi,
muitas vezes, para que os Estados-Nação ignorem ou desrespeitem essas normas.
Nesse cenário, a pressão e a atuação direta de grupos organizados da sociedade civil,
nacional e internacional, desempenham papel fundamental. Reconhecer e discutir essa atuação é
apenas de uma escolha e de um recorte analítico que permitem ressaltar os momentos de protagonismo de movimentos sociais e organizações não-governamentais, tanto no que se refere à
pressão das agências do Estado por políticas públicas quanto na ação política direta de construção de verdade, memória e justiça.
Assim, no presente artigo, primeiro discutiremos as linhas gerais do que se tem chamado por "justiça de transição desde baixo" na literatura especializada, assunto bastante recente
e pouco discutido no cenário brasileiro. Em seguida, passaremos em análise duas experiências
sociais relevantes para o aprofundamento da democratização brasileira, ocorridas em momentos
distintos e muito diferentes entre si, mas ambas alinhadas com esse paradigma de luta por verdade e justiça desde baixo.
A primeira dessas iniciativas é a preparação do acervo Brasil Nunca Mais, ainda nos
anos finais da ditadura, que foi levada a cabo por diferentes setores sociais e militantes de direitos humanos com o objetivo de documentar as violações de direitos humanos a partir do levantamento e da cópia de inquéritos policiais militares instaurados contra os opositores políticos.
Já a segunda experiência exemplar da mobilização desde baixo por verdade e justiça
são os Escrachos3 organizados por diferentes agrupamentos da juventude brasileira a partir de
2012, com o intuito de pressionar os trabalhos das Comissões da Verdade instaladas por todo o
3
A palavra que foi originalmente utilizada em países como Argentina e Uruguai para designar esse tipo
de ação direta é “escrache”. No Chile, utiliza-se o termo “furna”.
país e, sobretudo, com o objetivo de expor e constranger, publicamente, pessoas que tiveram envolvimento direto com a ditadura e as violações de direitos humanos.
2. Uma justiça de transição “desde baixo”
A ONU define a justiça de transição (JT) como o conjunto de abordagens, mecanismos
(judiciais e extrajudiciais) e estratégias adotado por cada país para enfrentar o legado de
violência em massa do passado, para atribuir responsabilidades, para exigir a efetividade do
direito à memória e à verdade e para fortalecer as instituições com valores democráticos (não
repetição das violações de direitos humanos) 4.
As reflexões sobre a justiça de transição5 estão ainda muito centradas na figura do Estado
e de suas instituições. No entanto, os estudos e debates acerca das experiências que integram o
conjunto de abordagens e mecanismos do que se convencionou chamar justiça de transição privilegiam o protagonismo estatal para indicar que a realização das tarefas dos eixos da JT (reparação, responsabilização, verdade e reforma das instituições) e dão algum destaque para as
ações realizadas pela sociedade quando ligadas à memória.
No Brasil, desde o retorno à democracia6, há iniciativas do Estado e da sociedade para
elucidar o passado do regime autoritário e apresentar respostas às demandas de justiça e
verdade. A ditadura (1964-1985) foi marcada não somente pela supressão de direitos e práticas
estatais de graves violações de direitos humanos mas, principalmente, pela ampla repressão
contra cidadãos vistos como opositores do regime militar, por meio de prisões,
desaparecimentos forçados, torturas, exílios, homicídios, banimentos, estupros, dentre outras
violências.
No cenário brasileiro dos últimos 25/30 anos, os esforços oficiais e não-oficiais foram
centrados no tratamento mais transparente do legado da ditadura, com atenção às vítimas e ao
seu direito de reparação e valorização do direito da sociedade de acessar as informações sobre
os acontecimentos mais violentos do período bem como de conhecer e recordar tais fatos, para
que nunca mais se repitam. Porém, essas iniciativas convivem, até hoje, com a impunidade dos
perpetradores (por causa da Lei de Anistia de 1979) e com a falta de explicação acerca das
circunstâncias e motivos das mortes dos presos políticos desaparecidos.
4
UN Security Council, The rule of law and transitional justice in conflict and post-conflict societies.
Report Secretary-General , S/2004/616, 23 August 2004, Transitional Justice, parágrafo 8, p.4
5
Uma análise mais detida do conceito de justiça de transição e das críticas a ele endereçadas na literatura
pode ser encontrada em QUINALHA, Renan Honório. Justiça de transição: contornos do conceito. São
Paulo: Dobra Editorial e Outras Expressões, 2013.
6
A despeito da existência de diferentes periodizações, consideramos que, no plano jurídico, a
transição brasileira se inicia, formalmente, com a promulgação da Lei de Anistia em 1979 e se consolida
com a Constituição de 1988.
Uma ponderação interessante e relativamente nova no que se refere à concepção de
justiça de transição é a que caracteriza a abordagem a partir das realizações de tarefas pelo Estado tradicional como “justiça de transição desde cima” (“transitional justice ‘from above”)7. Em
contraste, ganha força a concepção de justiça de transição "desde baixo", que pretende destacar
a participação da sociedade civil nesses processos, analisados sob o ângulo da institucionalidade
e, especialmente, dependentes da vontade dos governos.
Esse enfoque “desde baixo”, que se inspira declaradamente nos “estudos subalternos”
(“subaltern studies”), consiste em analisar a “a justiça de transição no chão nas comunidades ou
organizações que foram diretamente afetadas pelo conflito violento”8. Os autores engajados
nessa perspectiva postulam a necessidade de avançar “por baixo do olhar das instituições formais da justiça de transição”, denotando o termo ‘from below’ “um caráter resistente ou mobili zador das ações comunitárias, da sociedade civil e de outros atores não-estatais, na sua oposição
às poderosas forças políticas, sociais e econômicas hegemônicas” 9.
Nesses estudos, baseados nas experiências em curso em diversos países, o objetivo
maior é analisar e respaldar as vozes locais - dos que sofreram diretamente a violação e da soci edade civil (geração atual que herdou o legado autoritário) em suas iniciativas para a memória e
verdade. Parte-se do pressuposto que estas iniciativas “informais” são peças essenciais tanto da
política de memória como das ações de reparação simbólica das vítimas e responsabilização pública dos perpetradores.
A concepção é interessante para o caso brasileiro, em razão do largo lapso temporal
que separa os acontecimentos da ditadura das iniciativas adotadas pela sociedade no momento
atual. Na arena brasileira, principalmente em decorrência da vigência lei de anistia (de 1979), há
um repúdio à impunidade, com estratégias de órgãos públicos e da sociedade civil.
A construção e consolidação de uma justiça de transição de baixo para cima é uma atividade que exige dos próprios atores uma mudança em seu modo de agir, com maior integração e
com uma reflexão sobre as estratégias mais adequadas para atuar de modo compartilhado. Esse
compartilhamento pode ser entre grupos da sociedade civil ou mesmo entre Estado e sociedade
civil10.
7
MCEVOY, Kieran; MCGREGOR, Lorna. Transitional Justice from Below: An agenda for research,
policy and praxis. In: ______.; ______. (Ed.). Transitional Justice from Below: Grassroots Actvism and
the Struggle for Change. Oxford and Portland, Oregon: Hart, 2008. p. 5.
8
MCEVOY, Kieran; MCGREGOR, Lorna. Transitional Justice from Below, p. 2/4.
9
MCEVOY, Kieran; MCGREGOR, Lorna. Transitional Justice from Below, p. 5.
10
O Estado entra com apoio financeiro ou com outro tipo de apoio que de algum modo dê suporte às ativi dades da sociedade civil, por esta concebida e desenhada, sem margem de interferência do Estado-financiador/incentivador.Como exemplos, podemos mencionar o prêmio de menção honrosa dado ao Levante
da Juventude, em 2012; e os financiamentos do Projeto Marcas da Memória. O Marcas da Memória seleciona propostas de Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) e entidades privadas
sem fins lucrativos (cadastradas no Portal dos Convênios Siconv) e financia projetos ligados a perseguições políticas ocorridas no Brasil no período da ditadura militar (1946 a 1988), no valor de 30 a 600 mil.
No resultado da 3ª Chamada Pública, referente a 2012, do projeto mencionado, foi publicada a seleção de
As iniciativas não-oficiais mais exitosas para a memória e verdade são também os me lhores exemplos da potencialidade da combinação da criatividade com os mecanismos jurídicos
de garantia de direitos básicos. Destas iniciativas, focadas nas atrocidades praticadas na ditadura
brasileira, destacamos duas: o acervo produzido pelo projeto Brasil: Nunca Mais, capitaneado
pelo D. Paulo Evaristo Arns e pelo reverendo Jaime Wright, lançado como livro homônimo; e a
divulgação, por movimentos de jovens, de informações sobre quem praticou atos de tortura, desaparecimento e assassinatos durante a ditadura militar brasileira, em atos públicos denomina dos escrachos.
A seguir, analisaremos como as duas experiências mencionadas, o "Brasil Nunca
Mais" e os escrachos, contribuíram ou ainda vêm contribuindo para a efetivação dos direitos humanos em nosso peculiar processo transicional.
3. Experiência do Brasil Nunca Mais
O direito à verdade trilhou um caminho que não passou pela formação de um acervo
judicial relevante depois do retorno à democracia, principalmente por causa da Lei de Anistia
(1979). Não se tem o registro oficial da responsabilização criminal dos que praticaram as mais
graves violações aos direitos humanos durante o regime autoritário. Por conseqüência, falta ao
Estado Democrático brasileiro um conjunto documental que, caso existisse, seria considerado
como de guarda permanente 11 e imprescritível12, beneficiando-se das normas atuais para gestão
documental do judiciário, previstas na Recomendação n. 37/2011, do Conselho Nacional de
Justiça.13
O acervo do Superior Tribunal Militar (STM) proporcionou a revelação da verdade sobre
as torturas e outros crimes praticados contra os presos políticos durante a ditadura. Foi com o
projeto Brasil: Nunca Mais que os acontecimentos nefastos e as graves violações aos direitos
humanos vieram à tona. Até hoje o acervo do STM é uma importante fonte de pesquisa para
vinte e três projetos de memória e reparação coletiva a violações cometidas no período da ditadura militar
(1946 a 1988) e que “entre os contemplados estão projetos para a construção de lugares de memória; digitalização de acervos; realização de documentários; produção de mini-documentários; implementação de
observatórios; criação de centros eletrônicos de informação; intervenções artísticas; peças teatrais; mostra
audiovisual, publicações de livros (inclusive digital); palestras e seminários; e materiais didáticos.”
http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJD59503A9ITEMID14D8587C97574E668692AAB61F93865EPTBRNN.htm, acesso em 01.03.2013
11
Art. 8 º, § 3º da Lei 8.159/91: Consideram-se permanentes os conjuntos de documentos de valor
histórico, probatório e informativo que devem ser definitivamente preservados
12
Art. Art. 10º, da Lei 8.159/91: Os documentos de valor permanente são inalienáveis e imprescritíveis.
13
Dentre outras medidas, esse documento prevê a guarda permanente dos processos e documentos de
valor histórico e sua integração ao fundo arquivístico das instituições do Poder Judiciário. Além disso,
esses documentos e processos de guarda permanente devem ser disponibilizados para consulta e não
poderão ser eliminados, mesmo que digitalizados.
realização de documentários, filmes, livros, entrevistas, matérias jornalísticas e mesmo para
formas de expressão cultural ligadas a espetáculos e artes visuais.
Em 1985, como iniciativa não-oficial, foi lançado o livro Brasil: Nunca Mais14, a partir
do acervo integrante do projeto homônimo, capitaneado por D. Paulo Evaristo Arns e pelo
reverendo Jaime Wright. Este livro foi um best seller em termos editoriais e foi fundamental ao
revelar os acontecimentos mais nefastos ocorridos, como perseguições, assassinatos,
desaparecimentos forçados e torturas, além de trazer a público os atos praticados nas delegacias,
unidades militares e locais clandestinos mantidos pelo aparelho repressivo no Brasil.
Apesar de toda a relevância da publicação, este livro reflete a sistematização de pequena
parte do material colhido, já que o acervo do projeto Brasil Nunca Mais é formado por mais de
1 milhão de cópias em papel e 543 rolos de microfilmes extraídos de 707 processos judiciais do
Superior Tribunal Militar (STM). Esse projeto teve início ainda na ditadura, em 1979, logo após
a aprovação da Lei de Anistia. Neste momento, foi possível que advogados de presos e exilados
políticos tivessem acesso aos arquivos do STM, para preparar petições de anistia em nome de
seus clientes. A oportunidade de acesso foi aproveitada pelos defensores para fotocopiar o
maior número possível de processos e assim garantir um registro do terror praticado pelo
Estado, a partir de uma fonte oficial, o STM.
Com a incorporação das Tecnologias da Informação, o Brasil: Nunca Mais ganhou novos
ares. Em 2005 foi criado o Centro de Referência Virtual Brasil Nunca Mais 15, com a finalidade
de digitalizar e disponibilizar na rede mundial de computadores quase a totalidade do acervo.
Em 2011, numa continuidade, é lançado o projeto Brasil Nunca Mais Digital16, com a finalidade
de digitalizar o restante dos documentos do projeto original, bem como cerca de 4 mil
documentos do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) , relacionados com o financiamento do
projeto e com o momento histórico em que o projeto se desenvolvia.
A incorporação das Tecnologias da Informação (TI) nesse projeto é predominantemente
para ações de digitalização dos documentos e disponibilização do acervo na rede mundial de
computadores-internet. Essas ações são relevantes para a promoção da verdade e também para a
tarefa de recordar, principalmente porque permitem uma multiplicação das informações com
grande velocidade.
O Brasil: Nunca Mais resgata os depoimentos das vítimas, prestados em processos
judiciais, para relevar publicamente a violência, com a finalidade de que nunca mais aconteça.
Os discursos colhidos e expressos no livro retratavam a situação de muitas vítimas: “consciente
de não ser o único sujeito à tortura, a voz do torturado apresenta a dor dos outros no interior do
14
O livro foi reimpresso vinte vezes somente nos seus dois primeiros anos de vida, e em 2009 estava na
sua 37ª edição (2009).
15
Maiores informações em http://www.armazemmemoria.com.br/
16
Maiores informações em http://www.prr3.mpf.gov.br/bnmdigital/, acesso em 21.03.2013.
processo narrativo em que expõe a sua, suprimindo a fronteira entre ele e os outros à sua volta,
que com ele partilham o terror”17.
O projeto é, portanto, focado nas atrocidades praticadas, na vivência real da tortura, na
lembrança das dores físicas que pareciam intermináveis. Assim, a predominância das
circunstâncias públicas (a necessidade de revelar para que todos saibam) é motivo seria
suficiente para justificar a preponderância da revelação da verdade no caso de um
balanceamento com o direito à privacidade. O acesso a estes dados e informações, tanto no
formato de papel quanto no digital, têm essa finalidade. E a amplificação dessa informação pela
tecnologia vem com uma garantia de não repetição, como um reforço do “Nunca Mais”.
Paulo Sérgio Pinheiro conta que quando foi publicado o Brasil Nunca Mais, em 1985,
ouviu “nos circuitos do establishment político que faltava aos promotores da investigação, Dom
Paulo Evaristo Arns e ao pastor Jaime Wright, falta de tato político, abrir as cavernas dos
vampiros logo na celebração da redemocratização” 18. Mas da caverna não saíram vampiros tão
temidos pelo establishment de então. Pelo contrário, passados mais de 25 anos dessa publicação,
agora são os jovens se organizam para dizer em voz alta, na porta da casa dos agentes que
praticaram os crimes da ditadura e ficaram impunes, que ali mora um torturador e não se pode
esquecer isso enquanto não houver justiça.
Para usar o lema que anima essas ações dos jovens, que protagonizam o movimento de
denúncia, “enquanto não há justiça, há escracho”. Esse é o assunto do próximo tópico.
4. Escrachos
Em dezembro de 2012, na 18ª edição do Prêmio Direitos Humanos 2012, promovido pela
Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, o Levante Popular da
Juventude19 foi o homenageado com uma Menção Honrosa. Está explicado na Revista sobre o
evento que este “prêmio consiste na mais alta condecoração do governo brasileiro a pessoas
físicas ou jurídicas que desenvolvam ações de destaque na área dos Direitos Humanos” 20. Na
mesma revista, na apresentação do Levante consta: “Nascido no Rio Grande do Sul em 2006, o
Levante Popular da Juventude é um movimento social que tem por objetivo organizar os jovens.
Para tanto, o coletivo busca articular três sujeitos aparentemente distintos, mas muito próximos
em sua essência: o Movimento Estudantil, o Movimento Camponês e o Movimento Popular
17
Jaime Ginzburg, Escritas da Tortura, in O que resta da ditadura: a exceção brasileira, Edson Teles e
Vladimir Safatle(org), Boitempo, 2010, pp.147-148.
18
PINHEIRO, Paulo Sérgio, Esquecer é começar a morrer – Prefácio, . In: SOARES, Inês Virgínia Prado;
KISHI, Sandra Akemi Shimada. Memória e Verdade: a justiça de transição no estado democrático
brasileiro. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p.15
19
http://levantepopulardajuventude.blogspot.com.br/
20
SEDH,
Revista
do
Premio
Direitos
Humanos,
2012,
p.9,
disponível
em:
http://www.sedh.gov.br/.arquivos/Revista_PremioDireitosHumanos_internet.pdf, acesso em 22.03.2013.
Urbano. Em 2012 é realizado o 1° Acampamento Nacional do Levante Popular da Juventude,
em Santa Cruz do Sul (RS), que reuniu 1.200 jovens de 17 Estados do Brasil. O Levante
Popular centra sua atuação na luta pelo direito à verdade e à memória, na garantia da soberania
popular e no combate a todas as formas de preconceito”. 21
A homenagem ao Levante foi em razão da série de esculachos (ou escrachos) que esse
coletivo organizou contra torturadores e agentes da repressão da ditadura militar (1964-1985)
por diversos estados do Brasil. Outros grupos, como a Frente pelo Esculacho Popular (FEP 22),
também têm promovido diversas ações dessa natureza. Os participantes desses movimentos se
reúnem para denunciar e expor publicamente, sobretudo aos vizinhos, a participação dos
torturadores da ditadura militar que não foram processados por seus crimes pelo sistema de
justiça e que até hoje estão impunes.
Criatividade e justiça dão o tom e o sentido do Levante e dos outros movimentos
similares. O mote central que inspira essa forma de ação política é omissão do Estado brasileira
em fazer justiça e revelar a verdade sobre os acontecimentos mais violentos da ditadura. Por
isso, enquanto os que cometeram os crimes mais bárbaros durante esse período não respondem
judicialmente pelos seus atos, esses grupos se organizam para apontar à comunidade que ali
naquela rua, naquele bairro, vive (tranquilamente?!) alguém que torturou, matou ou fez pessoas
desaparecerem. É um recurso extremo, mas democrático e legítimo, especialmente porque
rompe com a cultura do silêncio e do esquecimento.
Diversos são os méritos dessa forma de ação política direta: pautar a necessidade da
realização da justiça; apontar a incapacidade e a falta de vontade política predominantes nas
políticas públicas para atingir esse objetivo; disputar a construção social e política da memória
coletiva em torno das violências do passado, valorizando uma ética democrática e de respeito
aos direitos humanos; contribuir para a investigação da verdade em torno dos fatos e
circunstâncias ocorridos, apontando responsabilidades; dar publicidade e transparência a esses
fatos, tornando de conhecimento da sociedade e, especialmente, dos vizinhos; ser uma forma de
participação política e de conscientização da juventude; constrangimento público dos prováveis
autores, normalmente notórios torturadores, rompendo com a cultura da impunidade e a política
do silenciamento que influenciaram enormemente nosso processo transicional.
Essas manifestações acontecem há mais tempo no Chile, no Uruguai e na Argentina 23,
mas geralmente foram interrompidas a partir do momento em que o Poder Judiciário passou a
processar penalmente os criminosos das ditaduras. E isso não se deve ao acaso, pois o escracho
se coloca, justamente, como um sintoma da incapacidade das instituições do Estado em
21
SEDH, Revista do Premio Direitos Humanos,
2012, p.49, disponível
em:
http://www.sedh.gov.br/.arquivos/Revista_PremioDireitosHumanos_internet.pdf, acesso em 22.03.2013.
22
https://fep.milharal.org/
23
A ideia dos escrachos surge na Argentina, em 1995, e é posta em prática meses depois. Sobre a história
dos escraches, ver: http://www.pagina12.com.ar/diario/suplementos/no/subnotas/2139-411-2006-0327.html#arriba
corresponder às exigências éticas de uma sociedade que não mais se cala diante das graves
violações aos direitos humanos 24.
No Dicionário25, a palavra escrachar é definida como : “1. Fotografar e fichar (na polícia);
2.Desmoralizar(alguém), revelando-lhe as intenções ocultas; desmascarar; 3. Descompor injuriosamente; esculachar; esculhambar.”. O sentido que se enquadra ao vocábulo que dá nome ao
movimento que ora analisamos é o da revelaçâo das intenções ocultas da pessoa que é desmascarada. Esta, responsável por atrocidades num passado recente, não respondeu por seus atos no
âmbito judicial, o que acarreta prejuízo para todos, inclusive os autores dos crimes, que poderiam ser processados com todas as garantias de defesa e que, em virtude da impunidade reinante,
tornam-se objeto dos escrachos.
No Brasil, os Escrachos são iniciativas informais lidar com o legado de violência da
ditadura militar (1964-1985), as quais são promovidas por jovens que não foram vítimas com a
finalidade de protestar contra a impunidade dos agentes que praticaram torturas,
desaparecimentos, estupros, assassinatos e outros crimes nefastos e nunca responderam
criminalmente por seus atos.
Essa ação de protesto é temporária, provisória e sem qualquer poder formal de coerção,
durando apenas enquanto o Estado não assume seu dever de punir; opera, portanto, no plano
simbólico, com tomada clara de posições contra a impunidade. É, portanto, um ato de
indignação em relação ao sossego garantido pelo Estado àquele que praticou crimes bárbaros
durante a ditadura e nunca respondeu por estes atos.
Apesar do lapso temporal em aberto, que depende da realização de justiça pelo Estado, a
ação contra cada “escrachado” é geralmente única, já que o protesto serve para desmascarar o
agente que praticou o crime e denunciar a seus vizinhos que o mesmo permanece impune. O
escracho não serve para tornar a vida do perpetrador e de sua família inviável, indigna. Ao
mesmo tempo, a indicação da verdade, o esclarecimento público e em voz alta dos crimes que o
escrachado cometeu em um ato, com registro que pode ficar disponível na internet, é medida
equilibrada e proporcional à necessidade coletiva de saber a verdade sobre os acontecimentos
violentos da ditadura e ao resguardo da privacidade.
Note-se que no Estado Democrático brasileiro, além da Constituição, a Lei de Acesso às
Informações Públicas, na garantia e defesa dos direitos humanos, prevê expressamente que não
pode haver qualquer impedimento ou restrição no acesso a informações ou documentos que
24
A relação entre a busca da justiça institucionalizada e as ações políticas diretas fica bem clara nessa
declaração do movimento argentino H.I.J.O.S.: "Cuando nacimos como H.I.J.O.S., salimos a la calle con
la consigna que decía: “Si no hay Justicia, hay escrache” y parecía lejano llegar a estos Juicios. Pero de a
poco fuimos demostrando que lo imposible sólo tarda un poco más". H.I.J.O.S., Lo imposible sólo tarda
un poco más, 14 de mayo de 2010, disponível em http://www.hijos-capital.org.ar/index.php?
option=com_content&view=article&id=665:lo-imposible-solo-tarda-un-pocomas&catid=50:editoriales&Itemid=426. Acesso em 18 de março de 2013.
25
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Novo Dicionário da Lingua Portuguesa, 1 edição, Editora Nova
Fronteira, 1975.
versem sobre condutas que impliquem violação dos direitos humanos praticadas por agentes
públicos ou a mando de autoridades públicas 26. A citada lei também dispõe que a restrição de
acesso à informação relativa à vida privada, honra e imagem de pessoa não poderá ser invocada
com o intuito de prejudicar processo de apuração de irregularidades em que o titular das
informações estiver envolvido, bem como em ações voltadas para a recuperação de fatos
históricos de maior relevância27.
Os escrachos servem exatamente para revelar dados que a Lei de Acesso à Informação
considera de acesso irrestrito. Sob essa perspectiva, são um desdobramento do dispositivo legal;
são o próximo passo após ter acesso à informação que interessa para a memória e verdade. Para
realização dos escrachos, o acesso e o conhecimento dos fatos que serão denunciados
publicamente são obrigatórios. Esse conhecimento decorre de fontes fidedignas (em acervos
oficiais, em acervos privados - de ONGs e movimentos sociais historicamente comprometidos
com o tema - e em narrativas das vítimas) e realça um outro traço importante do escracho, que é
a seletividade.
A seleção e o tratamento das informações sobre as atrocidades cometidas conduzem à
escolha dos escrachados. A análise da viabilidade ou não do escracho deve ser sobre as
situações de impunidade mais escandalosas - aquelas que deixam o senso comum a pensar como
uma pessoa que praticou atos tão terríveis pode ter escapado de qualquer punição. A escolha é
de inteira responsabilidade dos que fazem o escracho e não são passíveis de qualquer controle
prévio. Ao mesmo tempo, esse processo seletivo não precisa ser formal ou organizado, mas é
necessário que tenha a reparação simbólica das vítimas da ditadura, a memória, a verdade e o
direito de sabê-la como diretrizes.
Por isso, nem todos os participantes dos crimes da ditadura são alvos de escracho. A
cadeia de atores e participes na repressão e violência aos opositores do regime e aos cidadãos
em geral é imensa e imprecisa. O movimento perderia o foco e correria o risco de praticar
injustiças, de errar seu alvo, que não são pessoas, mas a impunidade que gozem indevidamente.
O escracho não pretende, assim, ser uma “épica moral” ou de uma “epopéia justiceira”, mas
uma forma de disputa da memória coletiva em momentos de tensão política.
Em maio de 2012, o Levante promoveu o esculacho de um torturador apontado como um
dos responsáveis pelo desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva. Marcelo Rubens Paiva,
filho desse desaparecido político, escreveu um texto sobre os escrachos 28. O título é “Valeu” e
começa:“Sensação estranha essa. O que você faria se soubesse do endereço do militar
26
Lei de Acesso às Informações Públicas (Lei n. 12.527, de 18 de novembro de 2011), art.21, parágrafo
único. Este dispositivo reproduz artigo 14 da Lei Mexicana, Lei Federal de Transparência e Acesso a
Informações Públicas (ou Lei de Direito a Informação), de junho de 2002.
27
Art. 31 § 4°.
28
http://blogs.estadao.com.br/marcelo-rubens-paiva/valeu/, acesso em 22.12.2012
responsável pela tortura e morte do seu pai? E que ele circula pelo bairro livremente?. E
termina “Bacana. Criativo. Justo. Obrigado, garotada. A família agradece”.
Do ponto de vista jurídico, a verdade é um direito coletivo, que pode ser exercido
inclusive pelos que nem eram nascidos no tempo em que a violência fora cometida. E isso é
bem claro quando Marcelo Rubens Paiva, no texto citado, afirma que não fará nada em relação
ao algoz de sua família, no entanto diz que é justo que outros, os do Levante, revelem o que foi
feito a seu pai e à sua família, porque esses crimes importam à sociedade.
O mais interessante é que não há nenhum tipo de confronto físico ou de violência, elementos que poderiam desqualificar essas ações perante a sociedade, ao reduzi-las ao mero revanchismo. Na verdade, essas manifestações pacíficas e simbólicas, que articulam muito bem
política e estética, são pressões na luta pela construção de uma memória democrática e compro metida com os direitos humanos. Por um lado, os escrachos buscam visibilizar aqueles que historicamente vêm se escondendo sob a proteção de leis e instituições herdadas da própria ditadura, como a Lei de Anistia; por outro, essas ações são formas de restituir às vítimas o devido reconhecimento a que têm direito, acolhendo socialmente suas dores e chamando a atenção de setores da sociedade que não guardam relação direta com essa temática. Essas ações são também
educativas/esclarecedoras para uma grande parcela da população brasileira que sequer sabe (o
quer saber) o que aconteceu no passado tão recente.
Mas é preciso enfrentar uma questão central nesse tipo de prática: haveria uma
incompatibilidade de princípios entre essa forma de ação política direta e a construção da
democracia? Na Argentina, por exemplo, onde a prática dos escrachos foi mais difundida,
algumas pessoas se manifestaram publicamente criticando sua realização a partir de um discurso
democrático29.
Frente à essa questão, em primeiro lugar, é preciso destacar que não fosse este contexto
bastante peculiar do legado de violência deixado pela ditadura, de fato, não haveria como
defender a priori qualquer forma de protesto que se aproxima por demasidado da execração
29
Por exemplo, em artigo publicado no jornal La Nación, Joaquín Morales Solá afirma que "el "escrache"
es un método detestable (imaginado hace casi 70 años por el nazismo para identificar a sus enemigos) que
se ha instalado cómodamente en la vida pública del país. Ninguna voz oficial condenó nunca, o lo hizo
tardía y forzadamente, cuando los "escraches" afectaban a los adversarios del Gobierno. El oficialismo
sólo se escandaliza cuando ese método maltrata a los suyos". Disponível em
http://www.lanacion.com.ar/1096331-cuando-la-politica-no-es-dialogo-es-violencia. Acesso em 18 de
março de 2013. Também Carlos Balmaceda, em artigo intitulado "El lado oscuro del escrache", afirma
que "en todo tiempo, el escrache busca administrar castigos y escarmientos en la escena pública. Es una
técnica política violenta que persigue la sanción ideológica, aunque actúe del lado de la ley o al margen
de ella.Lo grave es que el escrache se opone a toda ética de la memoria, ya que es un mecanismo político
usado por el poder genocida para identificar, clasificar y matar a millones de personas. Sólo por eso, la
legitimación del escrache es un acto que niega la historia y el padecimiento atroz de las víctimas, y ofende
a quienes creemos que los crímenes de lesa humanidad jamás prescriben. No sólo debe repudiarse a los
genocidas, también deben repudiarse sus métodos, estrategias y tácticas. Adoptar sus prácticas desvirtúa
la esencia de la justicia y lesiona la vigencia de los derechos humanos. ¿En serio el escrache nos parece
democrático?. Disponível em http://www.iruya.com/iruyart/contribuciones/el-lado-oscuro-del-escrache007801.html. Acesso em 18 de março de 2013.
pública e causa um constrangimento à pessoa “escrachada”. Mas em um cenário como o
brasileiro, de completa impunidade em relação às violações do passado, de desrespeito flagrante
aos direitos humanos e de instituições ainda franqueadas a grupos herdeiros do autoritarismo do
passado, não há como se falar na preponderância da privacidade e do esquecimento em
detrimento do direito coletivo de memória e de saber a verdade sobre os piores acontecimentos
da ditadura. A perspectiva de transformação passa, justamente, pelo tensionamento desses
limites construídos e fixados historicamente a partir de correlações de forças políticas
determinadas. E a democracia brasileira fornece os suportes para que dessa tensão, prevaleça a
liberdade de expressão e de informação e o direito de memória e verdade.
Nesse sentido, não há como condenar de partida táticas de luta por justiça, memória e
verdade dos grupos e movimentos sociais, como a dos escrachos. Essas iniciativas informais –
desde baixo- se pautam em estratégias que extrapolam a gramática legal do Estado de Direito
justamente para lhe conferir maior legitimidade e ampliar seus estreitos limites para absorver as
demandas de justiça por parte das vítimas e seus familiares. Somente uma concepção muito restrita, minimalista e formalista de democracia seria incapaz de admitir ações dessa natureza. E
essa concepção perde terreno na defesa dos direitos coletivos no Brasil.
5. Conclusão
Toda nossa argumentação nesse artigo teve a finalidade de destacar a importância do
manejo criativo dos mecanismos e instrumentos políticos, sociais, culturais e jurídicos para o
avanço no modo de lidar com o legado de violência da ditadura brasileira "de baixo para cima".
E para isso, tomamos por exemplo e descrevamos duas diferentes formas de ação política: o tão
bem sucedido projeto Brasil Nunca Mais e o mais recente movimento denominado Escracho.
Mostramos que cada uma dessas formas de manifestação revela, à sua maneira, a
necessidade de abertura e uso de outros recursos existentes no plano jurídico para a vivência e
avanço dos direitos humanos. Essas iniciativas, ao agirem de modo contundente, transparente e
direto, são exemplos de contribuições exitosas para o não esquecimento; são formas bem
sucedidas de dizer, na esfera pública e por canais não oficiais, que há determinadas violações
que não podem ser apagadas sem que se conheça e responsabilize quem as praticou.
O projeto Brasil Nunca Mais não lograria êxito se não houvesse ousadia e coragem por
parte de seus idealizadores para aproveitar a possibilidade legal de acesso aos processos
militares para driblar a política de sigilo que inviabilizava a divulgação ampla das torturas ou
outras violências denunciadas nos autos judiciais copiados e microfilmados. Por sua vez, os
Escrachos não teriam o reconhecimento público, inclusive com premiação do governo, nem
tampouco seriam ações viáveis e replicáveis se não estivessemos no Estado Democrático de
direito comprometido com a garantia dos direitos humanos e no qual o exercício das liberdades
é possível.
Entendemos que, no cenário brasileiro, essas iniciativas informais podem ser analisadas
sob a perspectiva de ações inseridas na política de memória de modo mais amplo, aquela que
“se ocupa de como a sociedade interpreta seu passado e como se apropria dele com o fim de
modelar seu futuro. Como tal, essa política constitui parte integrante de todo o processo político,
inclusive do progresso para uma democracia mais profunda” 30. A absorção do Brasil Nunca
Mais nessa arena da memória é inconteste. Quanto aos Escrachos notamos igualmente seu valor
potencial de transformação na medida em que a justiça passa a ser pensada e discutida em outro
patamar, não apenas pelo viés reducionista da legalidade, mas também pelas demandas
legítimas das vítimas da ditadura e dos setores sociais que lhe são solidários.
Assim, as duas iniciativas analisadas são demonstrações de que é possível romper com a
tendência, cada vez mais acentuada em nossos dias, de modular as respostas às demandas de
acordo com códigos e normas jurídicas. Nossa concepção é que essa modulação - além de
empobrecer o agir politicamente – decorre da dificuldade acentuada que a própria sociedade tem
de transitar por canais de caráter coletivo e não decorre da imposição legal, já que a democracia
permite imaginar e realizar uma gama de ações para atender aos anseios sociais.
Não desconhecemos que a contribuição teórica é sempre muitíssimo mais limitada do
que a riqueza das experimentações e manifestações, especialmente das vindas “desde baixo”.
Mas é a conjugação de bons argumentos com boas práticas pode significar algum avanço. E foi
por isso, que procuramos realçar nesse artigo a existência de mecanismos jurídicos que
amparam a capacidade criativa de afirmar indignação contra atrocidades e injustiças; e que estes
mecanismos podem ser usados garantir o direito de contar a verdade e construir de uma
memória coletiva plural31, com narrativas e histórias das vítimas ditadura.
30
BRITO, Alexandra Barahona de.
Políticas hacia el pasado: Juicios,
BRITO, Alexandra Barahona de,
Ediciones Istmo, 2002, p. 245.
31
BRITO, Alexandra Barahona de.
Políticas hacia el pasado: Juicios,
BRITO, Alexandra Barahona de,
Ediciones Istmo, 2002, p. 245.
Verdade, Justicia, Memória Y Democratización en el Cono Sur, Las
Depuraciones, Perdón Y Olvido em las nuevas democracias, Eds:
FERNÁNDEZ, Paloma Aguiar, ENRÍQUEZ, Carmen González,
Verdade, Justicia, Memória Y Democratización en el Cono Sur, Las
Depuraciones, Perdón Y Olvido em las nuevas democracias, Eds:
FERNÁNDEZ, Paloma Aguiar, ENRÍQUEZ, Carmen González,