Na crise climática que vivemos, faz sentido ampliar a exploração de petróleo e, ao mesmo tempo, desestimular consumidores que geram sua própria energia limpa por meio do sol?

Eclipse solar
Com um potencial solar imenso, o governo brasileiro tem se preocupado mais em expandir a energia suja do petróleo do que incentivar a micro geração de energia limpa – Foto: Giselle Hardy / Greenpeace

Em meio à inoperância ou incompetência do governo para lidar com os impactos do óleo no Nordeste, e a tentativa frustrada de realizar dois leilões do pré-sal, um aspecto têm sido pouco mencionado nas coberturas da mídia nesses dois eventos, mas fundamental para se evitar tanto novas tragédias que mancham o nosso litoral como a redução das emissões de gases de efeito estufa: a transição energética do país para fontes limpas e renováveis. Neste momento, a mudança de regras para microgeração pode frear o crescimento recente da energia solar.  

Desde 2012, é regulamentada a possibilidade de que os brasileiros gerem sua própria energia (ou parte dela) em suas casas, em indústrias ou estabelecimentos comerciais. A revisão seguinte da resolução da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) ampliou a modalidade para compartilhamento de telhados – neste caso, mesmo se os painéis solares estiverem instalados em um único local, a conta pode ser dividida entre dois ou mais consumidores – e a redução do preço dos sistemas fotovoltaicos fez com que a energia solar se tornasse a fonte que mais cresce no Brasil, gerando energia para mais de 140 mil residências.

 A Aneel propõe agora que quem gera energia solar passe a pagar uma taxa adicional sobre o valor da energia limpa que produz. A justificativa é que esses micro produtores, que hoje representam apenas 0,2%, usam a rede de distribuição existente. Mas a mesma Aneel desconsidera que essa produção de energia solar representa economia para os reservatórios das hidrelétricas ou menos combustível gasto nas termelétrica. Mais: a energia solar é a que gera mais empregos por MW instalado – 30 postos de trabalho contra menos de 6 no caso das termelétricas. No cenário revolução energética, estimamos que a evolução da energia solar gerará 52 mil empregos, quase o dobro de empregos que gerados por térmicas a óleo e gás (28 mil).

Estudantes instalam painéis solares na escola
Painéis solares já são solução em escolas de várias cidades no mundo, mas no Brasil não recebem incentivos. Foto: Markus Forte / Greenpeace

Desincentivo arriscado 

A cobrança da taxa pode reduzir em até 32% o valor que esses micro produtores recebem pela energia que geram e não consomem, ou seja, que acaba transferida para a rede. Por consequência, o tempo de retorno do investimento gasto nesses sistemas, que atualmente varia de 4 a 6 anos, passa a ser maior. Se esta mudança, que ainda está em consulta pública até o dia 30 for confirmada, trará um grande desincentivo à instalação dos sistemas fotovoltaicos e deve frear parte importante da expansão da energia solar no país. Por mais que seja previsto um período de transição de dez anos para quem já possui instalações, a medida frustraria consumidores que esperam gerar energia limpa nas condições previamente acordadas por pelo menos 25 anos, que é a durabilidade mínima desses sistemas. Ou seja, em vez de ter energia elétrica de graça, após o pagamento dos painés, esses produtores-consumidores continuariam tendo um custo permanente.

Em vez de beneficiar a rede elétrica, essa taxação pode incentivar que os novos micro produtores optar por usar os painéis solares desconectados da rede elétrica,  apoiados apenas com o uso de baterias. Ironicamente, a realidade nos últimas dias reforçou esta tese: a audiência promovida ontem pela própria Aneel para discutir o tema ficou sem luz por alguns minutos; um sinal do que pode acontecer de forma muito mais ampla se o governo brasileiro não incentivar as fontes limpas e continuar investindo no atraso ou no passado – a emergência climática não permite mais perda de tempo, a hora de fazer uma transição rápida e eficiente para o futuro é agora.

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