Treinamento Folha   Folha Online
   
07/04/2010

Marcio Aith - Pedi demissão para ganhar um terço do que eu ganhava

André Sarmento/Folhapress
Márcio Aith na entrega dos prêmios do Folha Invest, em 2004.
Márcio Aith na entrega dos prêmios do Folha Invest, em 2004.

Complemento ao livro A Vaga é Sua
VOLTAR AO ÍNDICE

Como foi parar no jornalismo?

Vim de uma família de advogados. Na minha cabeça, eu seria naturalmente advogado. Prestei direito na USP e jornalismo na PUC e passei nas duas, mas só fiz o direito. Achava o jornalismo uma coisa meio exótica. Ao longo do curso, seguia como leitor diário de todos os jornais. Mas nem tinha vontade de ser jornalista de novo.

Quando terminei, fiz a OAB e advoguei por um ano na área civil e trabalhista. Tinha 21 anos de idade. Foi o pior ano da minha vida. Descobri que não gostava da advocacia, gostava dos conhecimentos, dos debates, de tudo o que hoje uso no jornalismo. Achei a vida de advogado muito chata. Ninguém lê as coisas que você escreve. Eu estava muito triste, achando que tinha feito a escolha errada.

E como foi a transição para o jornalismo?

Tinha uma turma do direito que foi parar na Gazeta Mercantil. A Gazeta ignorava a obrigatoriedade do diploma, ainda mais nessa área do direito, porque lá tinha uma editoria só de legislação. Comentando com um amigo que eu não estava gostando de advogar, ele me disse que conhecia o pessoal da Gazeta. Aí fui fazer a entrevista.

Como foi?

Eles me perguntaram se eu sabia que o texto jornalístico era diferente do texto de advogado. Se eu estava disposto a ganhar menos. E se estava disposto a trabalhar bastante. Eu estava triste demais no direito, então fui. Pedi demissão para ganhar um terço do que eu ganhava.

Você escrevia bem?

Eu nunca achei que fosse um escritor excepcional, achava que escrevia de forma clara. Tinha vícios do direito que levei para o jornalismo.

Como foi seu primeiro dia de trabalho?

Recebi uma pauta. Fui enviado para o fórum para fazer matéria sobre a falência de uma grande empresa na área de petroquímica. Voltei com várias informações e eles elogiaram. Mas, na hora de escrever, foi um deus nos acuda. A editora leu o texto e falou: "Isso aqui está ilegível". E ela foi me ensinando a hierarquizar informação.

Foram uns seis meses de intenso sofrimento. Sofrimento relacionamento principalmente à forma de escrever. Eu tinha talento, se é que tenho algum, na hora da apuração. Mas não entendia o processo pelo qual a informação virava notícia.

Também tive dificuldade quando me mandaram acompanhar essa falência por um mês. Eu achava que não tinha notícia ali, eu achava que o mundo não funcionava com a lógica das notícias diárias. Eles me falavam: "Não sei se você tem notícia ou não, mas matéria você tem que ter". A necessidade faz o ladrão. Aí eu passei a raciocinar como jornalista.

Nunca se arrependeu de ter largado o direito pelo jornalismo?

Várias vezes. Principalmente quando eu levava bronca eu achava que tinha tomado a decisão errada. E eu tomava bronca quando cometia os erros. Uma vez eu fiz uma matéria de uma empresa com o balanço de outra empresa, porque me mandaram o balanço errado. Essa matéria não saiu, mas levei bronca mesmo assim.

Uma vez levei uma bronca tão grande do Matías Molina que falei "vou embora para casa e não volto nunca mais". Mas no dia seguinte ele falou que só dava bronca em quem valia a pena, e acabei ficando.

Você acha que a faculdade de jornalismo fez falta?

Acho que alguma coisa é necessária. Aquele foi o lugar exato para eu aprender jornalismo. A Gazeta era uma porta de entrada. Hoje você cai de paraquedas num modelo muito azeitado, consolidado, existe pouca tolerância para erros, pouco espaço para o aprendizado. Antes as redações podiam se dar ao luxo de ter 15 pessoas fazendo uma matéria que não ia sair. Tinham muito mais jornalistas que hoje. Era outro jeito de fazer jornal.

Alguma coisa você precisa ter para aprender jornalismo. Em algum lugar você tem que aprender, pode até ser na faculdade.

E como foi sua carreira na Gazeta?

Em um ano eu saí da editoria de legislação, passei pela de sindicalismo e pulei para a política.

E como foi parar na economia?

Todas as editorias eram ligadas à economia. A Gazeta tinha várias editorias, bem segmentadas, editoria de meio ambiente numa época que não se falava disso etc. Mas todas eram ligadas à economia.

E sentiu necessidade de aprender economia?

Sim. Fui estudando muito por conta própria. Li todos os manuais de macroeconomia. E tirava muitas dúvidas com o Matías Molina e o Celso Pinto. O Molina é um dos melhores professores de jornalismo que existem. O Celso Pinto tinha um enorme prazer em ensinar - e queria ter certeza de que você tinha entendido. Os dois me ensinaram muito macroeconomia e finanças. Eles partiam sempre do princípio de que tinham que ensinar.

O que sua família achou da sua escolha de sair do caminho da família e entrar no jornalismo?

Minha mãe me disse que achava uma loucura. "Jornalismo é hobby." E acho que ela ainda acha um pouco isso.

E se sua filha quisesse fazer jornalismo hoje, o que diria a ela?

Primeiro eu tentaria convencê-la a não fazer jornalismo. Mas eu pediria a ela para estudar alguma outra coisa, qualquer outra coisa, direito, história, filosofia, economia, administração...

VOLTAR AO ÍNDICE

BLOG

BATE-PAPO ESPECIAL
Patrocínio

Odebrecht
Philip Morris
Oi


Copyright Folha de S. Paulo. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress (pesquisa@folhapress.com.br).