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07/04/2010

Fábio Seixas - Queria trabalhar o quanto antes

Arquivo Pessoal
O primeiro crachá de Fábio Seixas.
O primeiro crachá de Fábio Seixas.

Complemento ao livro A Vaga é Sua
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Começou a trabalhar cedo?

Eu tava na faculdade Metodista e tinha uma ansiedade pra começar a trabalhar logo. Achava que quanto antes, melhor. O que aparecesse ali pra mim, eu topava. O que apareceu no primeiro ano da faculdade foi um estágio dentro do jornal da própria faculdade, que era restrito pra alunos de terceiro e quarto anos. Chegou um dia um cara na classe e falou que precisava de alguém pra trabalhar com Page Maker. "Alguém aqui na classe sabe mexer com Page Maker?" Eu peguei e levantei a mão. Mas nunca tinha ouvido falar do programa! Aí ele falou "tudo bem, amanhã de manhã tem uma prova prática, você vai lá pra fazer a seleção." E eu não tinha nem computador em casa! Saí da faculdade, comprei um livro, com umas 500 páginas, e virei a madrugada lendo o livro e fiquei só na coisa teórica - imagina você aprender um programa de computador sem mexer no programa -, mas meio que decorei. Fui pra prova no dia seguinte. E fui aprovado. Consegui fazer, mas só depois que comecei a mexer realmente com o programa que eu fui aprender.

Tinha concorrência?

Não, só tinha eu. Isso ajudou, né, com certeza (risos). E fiquei um ano fazendo isso na faculdade. Eu adorava, só de estar ali uma vez por semana, aluno do primeiro ano convivendo com alunos do terceiro e quarto ano... meu sonho era ser aqueles caras do terceiro ano.

Uma vez eu me enfiei com uma repórter que foi fazer um torneio de futebol em São Bernardo.

Até hoje quando estou meio sem tesão pra vir trabalhar, final de semana, eu lembro da minha empolgação naquele dia em cobrir o torneio de futebol, no sábado, às 7h da manhã, em São Bernardo. Eu era o cara mais feliz do mundo, lembro até que música eu estava ouvindo no carro.

Que música?

Era um pagode do Bezerra da Silva. Tento resgatar aquilo porque é coisa de quem está começando. Era um torneio super sem importância, mas pra mim era uma Copa do Mundo.

Você sempre quis fazer esporte?

Eu entrei na faculdade pra fazer esporte. Eu só decidi fazer jornalismo com a ficha da FUVEST na minha frente, porque minha dúvida era entre jornalismo e arquitetura. Mas na hora que decidi pelo jornalismo, já era esporte. Na época eu queria futebol. Acabei fazendo quase nada de futebol, mas o que pintasse eu queria fazer.

Daí fiquei um ano no estágio. Depois fui morar três meses nos EUA, no período de férias da faculdade. Quando voltei, em 1994, eu estava um dia na faculdade e entrou um cara na sala e perguntou: "A gente está precisando de alguém pra trabalhar numa rádio, de madrugada, pra começar no meu lugar amanhã. Alguém quer?" Eu levantei a mão. Foi meu primeiro emprego pra valer. Era na rádio Trianon, que era uma rádio que estava super forte, foi uma dissidência da Jovem Pan, uma turma muito boa. Tive que fazer um teste, que era basicamente transformar uma matéria de jornal em uma lauda de rádio. Foi mais ou menos parecido: comprei um livro da Maria Elisa Boechat, que era um manual de radiojornalismo, e passei a noite estudando. O teste tinha conhecimentos gerais, como aqui na Folha. Eu lia jornal e lia muito revista, tenho até hoje recortes de jornais guardados.

Aí entrei na rádio. Era da meia-noite às 6h da manhã. Saía da rádio às 6h, tomava café na padaria, e ia pra Metodista, que eu estudava de manhã. Meus pais falavam "cê ta louco". Eu ganhava R$ 400, pra trabalhar de madrugada e era rádio-escuta, ficava ouvindo as rádios, fazia um relatório de hora em hora do que estava acontecendo, colocava na mão do redator que estava na redação - que, em 99% das vezes, pegava aquilo, olhava, amassava e jogava no lixo. E ronda de delegacia, ligava pra delegacia, estrada, aeroporto, esse tipo de coisa. E quando acontecia alguma coisa, me mandavam pra fazer. E madrugada o quê que é? É polícia, né. Desgraça e tal.

Fiquei um ano na rádio e adorei. Eu falava: "um dia que eu trabalho lá, estou aprendendo mais do que estou aprendendo na faculdade. O que eu trago todo dia desse horário da madrugada é muito mais rico do que eu tenho na faculdade." Tanto que a turma que trabalhava lá é gente que deu certo, todo mundo se deu bem.

Por que saiu de lá?

Depois de um ano nessa, eu já comecei a pensar que precisava evoluir. A rádio era legal, mas não tinha muito espaço pra crescer lá dentro. Na época falei com o Julio [Veríssimo], na Metodista, "se pintar qualquer vaga na Folha vc me avisa". E aí pintou uma vaga na Folha ABC. E era pra cobrir polícia. Como era uma coisa que eu já estava fazendo na madrugada, pra mim foi legal.

Comecei na Folha no meio de 1995, como frila. Estava contratado na rádio, mas decidi apostar. Eu estava no terceiro ano da faculdade. Era engraçado que tinha dia que eu estava na faculdade, no meio da aula, e chegava o motorista da Folha perguntando quem é Fábio Seixas. "Ó, teve uma chacina no morro da Gasolina, vamos lá agora?" Daí eu deixava a aula e ia subir o morro. Ia aprender muito mais do que estaria aprendendo na aula. Aconteceu várias vezes isso, o pauteiro já mandava o motorista me tirar da sala.

No meu primeiro dia já me mandaram pra cobrir uma rebelião. Não tinha celular na época, então eu ficava passando a matéria pelo orelhão em frente da delegacia. Saía com um monte de fichas no bolso. Quer dizer, foi um baita aprendizado. Em tudo o que fiz aprendi muito, foram belas escolas.

Eram boas escolas de jornalismo, mas não de jornalismo esportivo, né?

Eu continuava com a idéia de fazer esporte. O que eu noto muito na molecada é que, se o cara quer cobrir política, já quer começar cobrindo o Planalto. Mas não dá pra começar fazendo o que quer. Eu queria dar um jeito de entrar na profissão, depois eu queria dar um jeito de entrar na Folha. Então, se me oferecessem qualquer outra coisa eu faria, porque acho que tem que dar um jeito de entrar. Uma vez dentro, você tenta...

Logo depois que entrei, a Folha ABCD fechou. Eu era frila e fiquei naquela coisa "o que vão fazer com a gente?". Cheguei em casa com uma caixa de papelão, com todas as minhas coisas, mas dias depois eu voltei com a caixa de papelão pro jornal. Foi uma semana só. Deram um jeito de recolocar todo mundo e fui pra Regionais, na Redação. Mas também fui passar temporadas em Campinas, Ribeirão, Rio Preto, São José dos Campos...

Mas meu negócio era esporte, então toda hora eu ia lá pentelhar o Melk [Melchiades Filho, então editor de Esporte], dar um jeito de ele saber quem eu era.

Como você fazia?

Na época tinha o Diego, que era pauteiro de Esporte. Ele era da minha classe na faculdade, puta amigo meu. Inclusive, quando a gente tava na faculdade, eu trabalhava na rádio ainda, pintou uma vaga na Folha pra trabalhar na Agência. Eu e o Diego estávamos na praia, saímos domingo de manhã pra vir fazer a prova. Ele passou e eu não passei.

Ficou chateado?

Não muito, porque eu já estava na rádio. Mesmo na entrevista eu falei que vim mais pra conhecer - o cara deve ter odiado. Eu tava começando na rádio e a vaga na Agência era pra um mês só.

E você foi rodar bolsinha pro Melk...

Toda hora eu ia lá falar com o Diego, fui conhecendo o Melk, fiz ele saber que já tinha morado nos EUA e que gostava de esporte etc. Por isso que eu entrei em Esporte. Eu estava em Regionais em 1996, e a Folha tinha um cara que fazia fórmula 1 e fórmula Indy, na época. E o cara que fazia Indy saiu de Esporte para Cotidiano e abriu uma vaga. E o Melk, por saber que eu tinha morado lá, me chamou. Até então eu nunca tinha imaginado cobrir automobilismo na vida. Eu achava que ia fazer futebol.

E ficou em esporte desde então?

Eu sempre tive medo dessa coisa de se especializar numa área. Acho que isso restringe muito o seu mercado, suas possibilidades. Se amanhã eu decidir sair daqui e ir cobrir política, muita gente vai achar estranho. Então eu nunca quis me especializar muito numa coisa, mas acaba acontecendo, foi meio inevitável. Porque quando você começa a fazer automobilismo, consome tanto seu tempo, você fica de março a novembro praticamente viajando, então vc fica muito em cima daquilo, não dá nem tempo de fazer outras coisas. Eu tentava fazer outras coisas de vez em quando, mas 95% é em cima daquilo.

Você tem vontade de fazer outra coisa?

Ah, eu tenho vontade de experimentar um dia. Política eu acho que é legal... Uma coisa que eu acho sensacional que as pessoas têm até preconceito é cobrir polícia. Num universo como São Paulo, acho que é impossível vc não conseguir achar uma história sensacional por dia de polícia, não só "mundo cão". Tem muita coisa que eu gostaria de fazer fora do Esporte.

Você se arrependeu de ter largado arquitetura por jornalismo?

Não, nem um pouco. Quando eu tava no cursinho, tinha aula de linguagem arquitetônica, e eu desenhava muito mal. A professora falava que meu desenho era primitivo. Então eu adoro, admiro, acho bacana, compro livros, mas não levaria o menor jeito. Não me arrependo, não.

Como o intercâmbio te ajudou, três meses nos EUA?

Pra mim é muito forte essa coisa de saber se virar. E essa coisa de morar fora, além do idioma, que ajudou muito, mas principalmente vc saber se virar. Chegar nos lugares e resolver.

Fórmula 1 é assim: em minha primeira corrida eu cheguei com um mapa de uma cidadezinha no meio da Alemanha, enviado pro fax, e eu tinha que chegar nessa cidadezinha. Eu nunca tinha ido pra Europa na vida, cheguei em Frankfurt às 23h30, aluguei um carro, com o mapa de fax fui seguindo e cheguei numa cidadezinha encravada no meio do mato às 2h30 pra dividir uma cama de casal com um repórter do Estadão!

Porque é assim. Tem um monte de corrida que é no meio do mato. A gente tem que se virar na casa de velhinhas.

Normalmente, o que acontecia: a gente saía de SP, chegava na, sei lá, Áustria às três da tarde lá, pegava um carro, dirigia três horas até o autódromo, chegava lá depois de 17 horas sem tomar banho, arrumava um lugar na sala de imprensa, instalava um telefone, 90% das vezes o telefone da Embratel não estava lá e ficava brigando com um austríaco, o cara instala seu telefone três horas depois, aí você tinha que sair pra ver o que aconteceu de notícia no dia, e eu fazia rádio também então tinha que tentar entrevistar algum brasileiro para colocar a voz dele no rádio, daí voltava pra sala de imprensa, escrevia todo o material do dia, ligava pro jornal, combinava, mandava, mandava os boletins pra rádio. Eu saía do autódromo às 22h30, pra ainda descobrir onde era a casinha da velhinha.

Como virou tão multiplataformas? Internet, rádio, TV, jornal.

Eu consegui amarrar a Folha com a rádio. As duas dividiam meus custos. Foi uma coisa de comum-acordo. O jornal não tava fazendo a temporada inteira de F1 há alguns anos. Quando consegui fazer isso em 1999, a gente começou a fazer todas de novo, e vem assim até hoje. E é aquela coisa de disciplina, vc tem que saber que hora para de fazer uma coisa pra começar a fazer outra.

E o fato de você ser de jornal é uma vantagem?

Eu era horrível no rádio no começo, eu não sabia falar, gaguejava, errava, tentava dez vezes gravar um boletim até ele sair. Foi uma questão de aposta da rádio, além da economia. Depois eu fui melhorando, hoje eu gravo dez boletins seguidos sem errar nada.

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