Acórdão – Improbidade Silvio Barros II

APELAÇÃO CÍVEL N° 628.546-1, DE MARINGÁ ­ 2ª VARA CÍVEL APELANTE 1: MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ APELANTE 2: SILVIO MAGALHÃES BARROS II APELADOS : OS MESMOS RELATORA: DESª REGINA AFONSO PORTES APELAÇÃO CÍVEL ­ AÇÃO CIVIL PÚBLICA ­ NOMEAÇÃO DE SERVIDORES EM CARGO COMISSIONADO 1) RECURSO DE SILVIO MAGALHÃES BARROS II ­ PRELIMINAR DE INAPLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AOS AGENTES POLÍTICOS AFASTADA ­ DESVIO DE FINALIDADE CARACTERIZADO ­ ATO DE IMPROBIDADE CONFIGURADO ­ APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ­ EXCLUSÃO DE SANÇÕES ­ RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 2) RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE AFASTADA ­ INCLUSÃO NA CONDENAÇÃO DA SANÇÃO DE RESSARCIMENTO DOS DANOS ­ RECURSO PROVIDO. 1. A lei de improbidade administrativa foi editada exatamente para a tutela do erário em face dos agentes políticos, aqueles eleitos pelo povo para representá-los e que, ao fazê-lo, empossam-se da res pública como se propriedade particular fosse. 2. Ato ímprobo se constitui como aquele que causa lesão ao erário, a conduta ilegal do agente público, ativa ou omissa, dolosa ou culposa, no exercício de sua função pública. 3. As penas previstas na Lei de Improbidade, devem ser aplicadas de acordo com o princípio da proporcionalidade. Vale dizer que, o juiz ao aplicar as sanções deve principalmente analisar, à luz do caso concreto, o grau de culpabilidade do agente. 4. Não obstante tais servidores tenham trabalhado em outros órgãos da Administração Pública Municipal, é certo que não desenvolveram atividades inerentes aos cargos nos quais foram nomeados. Desta forma, verifica-se que os servidores nomeados receberam por funções que, na verdade, não desempenharam.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 628.546- 1, de Maringá ­ 2ª Vara Cível, em que são Apelante 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, Apelante 2 SILVIO MAGALHÃES BARROS II e Apelados OS MESMOS.Trata-se de recurso de Apelação interposto contra sentença de fls. 1603/1608-v, que julgou procedentes os pedidos para o fim de condenar Silvio Magalhães Barros II a sofrer sanções previstas no art. 12, inciso III da Lei 8429/92 (perda da função pública, suspensão dos direitos políticos por cinco anos, pagamento de multa civil, arbitrada em dez vezes o valor de seu vencimento, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos), bem como ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios em favor do Ministério Público, arbitrados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).O Ministério Público do Estado do Paraná, em suas razões recursais (fls. 1613/1625) alega que Silvio Magalhães Barros II deve ser condenado no ressarcimento ao erário; que uma vez comprovado o desvio de finalidade na contratação de pessoal, são automáticos os danos ao Erário, tendo em vista os gastos com o pagamento dos salários; que é este o entendimento do STJ e do TJ/PR. Requer o provimento do recurso.Silvio Magalhães Barros II, às fls. 1739/1799, através de suas razões recursais alega preliminarmente serem incabíveis as sanções previstas na Lei 8429/92 aos agentes políticos, devendo ser extinto o processo por carência da ação. Quanto ao mérito sustenta que não houve desvio de finalidade na função exercida pelos funcionários comissionados; que o trabalho por eles prestado é característico de cargo comissionado; que não houve enriquecimento ilícito nem prejuízo ao erário; que não foi demonstrada a má-fé do administrador público; que houve excesso na condenação imposta uma vez que não foi aplicado o princípio da proporcionalidade. Requer o provimento do apelo.Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público do Paraná às fls. 1822/1847; por Silvio Magalhães Barros II às fls. 1854/1876 e pelo Município de Maringá às fls. 1814/1819 e às fls. 1877/1882.Parecer da Procuradoria Geral de Justiça às fls. 1893/1911, pelo provimento do recurso do Ministério Público do Paraná e pelo parcial provimento do recurso interposto por Silvio Magalhães Barros II para que seja excluída a sanção de perda de função pública.É o relatório.
DECIDO
Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos recursos interpostos.
O Ministério Público do Estado do Paraná ajuizou Ação Civil Pública sustentando que Silvio Magalhães Barros II, na qualidade de Prefeito Municipal de Maringá, em 16/02/2005 nomeou Eliane Goffi Mussio para o cargo de provimento em comissão de Assistente III, símbolo CC-6, e em 30/12/2005, exonerou a servidora do cargo anterior e a nomeou para o cargo de Assistente II, símbolo CC-5, em ambos os casos para prestar serviço no gabinete do Prefeito.
Todavia, Eliane Goffi Mussio foi lotada na Secretaria Municipal de Saúde e exerceu as suas funções no posto de saúde da Vila Morangeira, nas funções de recepcionista, e no posto de saúde Alvorada, nas funções de auxiliar de enfermagem.
Em 05/04/2005, o requerido nomeou Antonio Carlos Gomes para o cargo de provimento em comissão de Assistente IV, símbolo CC-7, para prestar serviço em seu gabinete.
No entanto, o servidor teria sido lotado na Secretaria Municipal de Trânsito e exercia suas funções no Terminal Rodoviário Vereador Dr. Jamil Josepetti, realizando pequenos reparos e serviços de manutenção do prédio e de suas redes elétricas e hidráulicas, além de outros serviços gerais.
O réu teria nomeado Cezar Augusto Pinto Rabello, em 28/02/2007, para o cargo de provimento em comissão de Assistente III, símbolo CC-6, para prestar serviço no seu gabinete. Porém, o mesmo foi lotado na Secretaria Municipal de Esportes nas funções de auxiliar de serviços gerais.
Tendo em vista que as funções exercidas pelos servidores nomeados pelo requerido serem típicas de cargos de carreira, o autor defendeu desvio de finalidade, afronta ao art. 37, V da Constituição Federal, existência de danos ao Erário e ocorrência de ato de improbidade administrativa.
Sentenciando o juiz singular julgou procedentes os pedidos para o fim de condenar Silvio Magalhães Barros II a sofrer sanções previstas no art. 12, inciso III da Lei 8429/92 (perda da função pública, suspensão dos direitos políticos por cinco anos, pagamento de multa civil, arbitrada em dez vezes o valor de seu vencimento, proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos), bem como ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios em favor do Ministério Público, arbitrados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

1) DO RECURSO DE SILVIO MAGALHÃES BARROS II DA PRELIMINAR DE NÃO CABIMENTO DAS SANÇÕES DA LEI Nº 8429/1992 AOS AGENTES POLÍTICOS
Aduz o apelante que os agentes políticos não se submetem a disciplina da Lei Federal nº 8.429/1992.
A Lei 8.429/92 dispõe:
“Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.
(…)
Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.”
A Constituição Federal, no seu artigo 37, § 4º, estabelece:
§ 4º – Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Destarte, não há em ambos dispositivos qualquer restrição que isente agentes políticos, e não tendo o legislador restringido, não pode o intérprete fazê-lo.
Ademais, é certo que a interpretação literal dos dispositivos em questão é condizente com a evidente finalidade teleológica da norma, que é a de incluir na sua esfera de responsabilidade todos os agentes públicos, servidores ou não, que cometam ato de improbidade administrativa.
Note-se que a Lei de Improbidade Administrativa não exige que o agente seja servidor público, muito ao contrário, prevê expressamente que não se exigirá tal condição para aplicação das penas nela previstas.
Ademais, conforme esclareceu o Procurador de Justiça às fls. 1896/1897: “A rigor, os regimes de responsabilidade da Lei 8.429 e do Decreto-lei 201 se complementam. Esse Decreto- lei encarrega-se da responsabilidade penal (penas de reclusão ou detenção ­ artigo 1º, §1º) e política (cassação do mandato ­ artigo 4º) dos Prefeitos, enquanto a LIA cuida da responsabilidade eminentemente civil dos agentes públicos, de cunho pecuniário, por intermédio das sanções de perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, multa civil e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais ou creditícios.”
Os agentes políticos, conforme posição doutrinária e jurisprudencial estão incluídos no regime da Lei nº. 8429/92 e muitos já foram punidos com as penas do art. 12, daquela lei. Logo, afasto a preliminar sustentada.
Neste sentido este Tribunal já decidiu:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – PREFEITO MUNICIPAL – NEGATIVA DE ATENDER REQUERIMENTOS APROVADOS PELA CÂMARA MUNICIPAL E DE PRESTAR INFORMAÇÕES AO MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. INOVAÇÃO RECURSAL – INADMISSIBILIDADE – ARTIGO 517 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 2. ILEGIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM – IMPROCEDÊNCIA – COMPETÊNCIA PREVISTA NA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL. 3. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO – INOCORRÊNCIA – O FORO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA É O LOCAL EM QUE OCORRER O ATO. 4. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO NÃO CONFIGURADO. 5. NULIDADE DA CITAÇÃO – ALAGAÇÃO DE NÃO TEREM SIDO ANEXADAS À CARTA PRECATÓRIA AS PEÇAS DOCUMENTAIS NECESSÁRIAS – INOCORRÊNCIA – CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTICA, ASSINADA PELO RÉU, CONFIRMANDO ENTREGA DAS CÓPIAS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. 6. NULIDADE PROCESSO – AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DOS ADVOGADOS SOBRE A EXPEDIÇÃO DA PRECATÓRIA – ATO DESNECESSÁRIO PARA A CITAÇÃO DO RÉU. 7.NULIDADE DO PROCESSO – INEXISTÊNCIA DE DECRETO JUDICIAL DECLARANDO A REVELIA – ALEGAÇÃO DESPROVIDA – EFEITOS MATERIAIS DA REVELIA AFASTADOS POR FORÇA DA NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO EM LITÍGIO. 8. AUSÊNCIA DE DESPACHO SANEADOR – DESNECESSIDADE – INOCORRÊNCIA DE NULIDADE. 9. ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE APLICABILIDADE DA LEI 8.429/92 PARA AGENTES POLÍTICOS – DESCABIMENTO – PREVISÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL. 10. ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 66 DA LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE MARIA HELENA – COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA LEGISLAR SOBRE A MATÉRIA – AUSÊNCIA DE AFRONTA À CONSTITUIÇÃO. 11. ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE COEXISTIR AS SANÇÕES DO DECRETO-LEI 201/1967 COM AS DA LEI 8.429/92 – IMPROCEDÊNCIA – SANÇÕES DE NATUREZAS DISTINTAS. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJPR – 4ª C.Cível – AC 0512744-8 – Umuarama – Rel.: Juiz Subst. 2º G. Fabio Andre Santos Muniz – Unânime – J. 05.05.2009) (destacou-se)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
APLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429/92 AOS AGENTES POLÍTICOS. 1. A lei de improbidade administrativa foi editada exatamente para a tutela do erário em face dos agentes políticos, aqueles eleitos pelo povo para representá-los e que, ao fazê-lo, empossam-se da res pública como se propriedade particular fosse. 2. Correta a decisão singular que afastou preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, recebendo a ação de improbidade administrativa. Agravo de Instrumento desprovido. (TJPR – 5ª C.Cível – AI 0542077-1 – Pato Branco – Rel.: Des. Rosene Arão de Cristo Pereira – Unânime – J. 26.05.2009)
Sobre o tema, também já se posicionou o STJ:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.429/92 E DO DECRETO N. 201/67 DE FORMA CONCOMITANTE. ATO IMPROBO QUE TAMBÉM PODE CONFIGURAR CRIME FUNCIONAL. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. JUÍZO SINGULAR CÍVEL E TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INAPLICABILIDADE DO PRECEDENTE DO STF (RECLAMAÇÃO N. 2.138/RJ) IN CASU.
1. Os cognominados crimes de responsabilidade ou, com designação mais apropriada, as infrações político-administrativas, são aqueles previstos no art. 4º do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, e sujeitam o chefe do executivo municipal a julgamento pela Câmara de Vereadores, com sanção de cassação do mandato, litteris: “São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato” […].
2. Deveras, as condutas tipificadas nos incisos do art. 1º do Decreto-Lei nº 201/67 versam os crimes funcionais ou crimes de responsabilidade impróprios praticados por prefeitos, cuja instauração de processo criminal independente de autorização do Legislativo Municipal e ocorre no âmbito do Tribunal de Justiça, ex vi do inciso X do art. 29 da Constituição Federal. Ainda nesse sentido, o art 2º dispõe que os crimes previstos no dispositivo anterior são regidos pelo Código de Processo Penal, com algumas alterações: “O processo dos crimes definidos no artigo anterior é o comum do juízo singular, estabelecido pelo Código de Processo Penal, com as seguintes modificações” […] (Precedentes: HC 69.850/RS, Relator Ministro Francisco Rezek, Tribunal Pleno, DJ de 27 de maio de 1994 e HC 70.671/PI, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 19 de maio de 1995).
3. A responsabilidade do prefeito pode ser repartida em quatro esferas: civil, administrativa, política e penal. O código Penal define sua responsabilidade penal funcional de agente público.
Enquanto que o Decreto-Lei nº 201/67 versa sua responsabilidade por delitos funcionais (art. 1º) e por infrações político-administrativas (art. 4º). Já a Lei n. 8.429/92 prevê sanções civis e políticas para os atos improbos. Sucede que, invariavelmente, algumas condutas encaixar-se-ão em mais de um dos diplomas citados, ou até mesmo nos três, e invadirão mais de uma espécie de responsabilização do prefeito, conforme for o caso.
4. A Lei nº 8.492/92, em seu art. 12, estabelece que “Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito” […] a penas como suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade de bens e obrigação de ressarcir o erário e denota que o ato improbo pode adentrar na seara criminal a resultar reprimenda dessa natureza.
5. O bis in idem não está configurado, pois a sanção criminal, subjacente ao art. 1º do Decreto- Lei nº 201/67, não repercute na órbita das sanções civis e políticas relativas à Lei de Improbidade Administrativa, de modo que são independentes entre si e demandam o ajuizamento de ações cuja competência é distinta, seja em decorrência da matéria (criminal e civil), seja por conta do grau de hierarquia (Tribunal de Justiça e juízo singular).
6. O precedente do egrégio STF, relativo à Rcl n. 2.138/RJ, cujo relator para acórdão foi o culto Ministro Gilmar Mendes (acórdão publicado no DJ de 18 de abril de 2008), no sentido de que “Se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, “c”, da Constituição”, não incide no caso em foco em razão das diferenças amazônicas entre eles.
7. Deveras, o julgado do STF em comento trata da responsabilidade especial de agentes políticos, definida na Lei n. 1.079/50, mas faz referência exclusiva aos Ministros de Estado e a competência para processá-los pela prática de crimes de responsabilidade. Ademais, prefeito não está elencado no rol das autoridades que o referido diploma designa como agentes políticos (Precedentes: EDcl nos EDcl no REsp 884.083/PR, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJ de 26 de março de 2009; REsp 1.103.011/ES, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 20 de maio de 2009; REsp 895.530/PR, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 04 de fevereiro de 2009; e REsp 764.836/SP, Relator Ministro José Delgado, relator para acórdão ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 10 de março de 2008).
8. O STF, no bojo da Rcl n. 2.138/RJ, asseverou que “A Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei n° 8.429/1992) e o regime fixado no art. 102, I, “c”, (disciplinado pela Lei n° 1.079/1950)” e delineou que aqueles agentes políticos submetidos ao regime especial de responsabilização da Lei 1.079/50 não podem ser processados por crimes de responsabilidade pelo regime da Lei de Improbidade Administrativa, sob pena da usurpação de sua competência e principalmente pelo fato de que ambos diplomas, a LIA e a Lei 1.079/1950, preveem sanções de ordem política, como, v. g., infere-se do art. 2º da Lei n. 1.079/50 e do art. 12 da Lei n.
8.429/92. E, nesse caso sim, haveria possibilidade de bis in idem, caso houvesse dupla punição política por um ato tipificado nas duas leis em foco.
9. No caso sub examinem, o sentido é oposto, pois o Decreto n. 201/67, como anteriormente demonstrado, dispõe sobre crimes funcionais ou de responsabilidade impróprios (art. 1º) e também a respeito de infrações político-administrativas ou crimes de responsabilidade próprios (art. 4º); estes submetidos a julgamento pela Câmara dos Vereadores e com imposição de sanção de natureza política e aqueles com julgamento na Justiça Estadual e com aplicação de penas restritivas de liberdade. E, tendo em conta que o Tribunal a quo enquadrou a conduta do recorrido nos incisos I e II do art. 1º do diploma supra (“apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio” e “utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos”), ou seja, crime funcional, ressoa evidente que a eventual sanção penal não se sobreporá à eventual pena imposta no bojo da ação de improbidade administrativa. Dessa forma, não se cogita bis in idem. 10. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 1066772 / MS Recurso Especial 2008/0129806-1 ­ julgamento 25-08-2009 ­ REL. Min. Benedito Gonçalves)

DO MÉRITO
O apelante sustenta não ter havido desvio de finalidade na função exercida pelos funcionários comissionados.
Não obstante tal alegação, restou comprovado nos autos que efetivamente os servidores foram nomeados para o cargo em comissão pelo então Prefeito Silvio Magalhães Barros II, para exercer as funções junto ao gabinete da Prefeitura.
Nos termos da Constituição Federal “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.” (art. 37, V)
Verifica-se que os cargos em comissão, de livre nomeação, são destinados ao exercício de atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Por sua vez, as atribuições diversas de direção, chefia e assessoramento exigem a participação em concurso público.
Da análise dos autos, verifica-se que os três servidores efetivamente foram nomeados (fls. 463 e 508) para realizar assessoramento junto ao gabinete do Prefeito Municipal. No entanto, conforme consta na sentença recorrida, as atividades exercidas pelos servidores eram típicas de servidores de carreira, vejamos.
Eliane Goffi Mussio foi nomeada para o cargo de assistente e esteve lotada em unidades de saúde, exercendo funções idênticas às dos funcionários de carreira, não configurando assim atribuições de direção, chefia ou assessoramento. Destaque-se ainda que a servidora estava subordinada à gerência da unidade de saúde.
Antonio Carlos Gomes exercia suas funções de serviços gerais junto ao Terminal Rodoviário Vereador Dr. Jamil Josepetti, cujas atividades eram realização de reparos elétricos e hidráulicos, além da execução de outros pequenos consertos. O servidor estava subordinado ao administrador do Terminal Rodoviário.
Ao contrário do alegado por Silvio Magalhães Barros II, pelos elementos dos autos verifica-se que efetivamente esses dois servidores não estavam assessorando o gabinete do Prefeito. Neste sentido, cumpre destacar a sentença singular (fls. 1605-verso):
“Primeiro, porque a melhor forma de testar o serviço é estando no lugar de quem procura pelo serviço e não estando do outro lado do balcão. Segundo, porque a forma por excelência de se detectar falhas no atendimento prestado à população pelo serviço público é através de serviço de ouvidoria. Terceiro, porque os funcionários lotados no local eram sabedores do cargo diferenciado ocupado pela autora, os pretensos dados e informações que Eliane poderia fazer a respeito da qualidade do serviço estariam distorcidos.”
No que diz respeito a Cezar Augusto Pinto Rabello, consta em seu depoimento pessoal (fls. 1507) que antes de ser nomeado funcionário público tinha a profissão de polidor autônomo de automóveis com cadastro na prefeitura. Quando foi nomeado, realizou serviços externos para a Secretária de Esportes e outras tarefas de serviços gerais.
Pelo depoimento pessoal de Cezar Augusto Pinto Rabello e pelos outros relatos constantes nos autos, verifica-se que o servidor efetivamente não realizou atividades inerentes ao cargo em comissão de assessoria.
Assim, pelas provas que constam nos autos é possível concluir pelo desvio de finalidade na contratação dos mencionados servidores.
Conforme constou na sentença (fls. 1606-verso): “o réu nomeou três pessoas para ocuparem cargos em comissão no gabinete, mas esses servidores jamais exerceram atribuições de direção, chefia ou assessoramento. O fato de os servidores em questão terem cumprido suas tarefas longe do gabinete do prefeito e do prédio da sede da prefeitura por si só não configura irregularidade. O problema reside no fato de que Eliane Goffi Mussio, Antonio Carlos Gomes e Cezar Augusto Pinto Rabello exerciam funções típicas de funcionários de carreira, em afronta clara ao art. 37, II, da Constituição, que exige prévio concurso público para investidura em cargo ou emprego público. Jamais os três funcionaram como assessores ou auxiliares diretos do Prefeito Municipal.”
Desta forma, fica afastada a argumentação de que o trabalho prestado pelos servidores é característico de cargo comissionado.
Com as nomeações irregulares, e com o desvio de finalidade restou caracterizada lesão à moralidade administrativa e em conseqüência caracterizou-se o ato ímprobo, nos termos do artigo 4º da Lei nº 8.429/1992:
Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.
Neste sentido vale destacar o parecer da Procuradoria Geral de Justiça:
“A conduta do apelante implicou em reluzente prática de ato administrativo, pois, agindo de maneira dolosa, contratou pessoas sob a forma de cargos em comissão, para exercerem funções díspares, em flagrante desrespeito ao ordenamento jurídico, demonstrando, também, a falta de apreço ao patrimônio público e moralidade administrativa.”
Ato ímprobo se constitui como aquele que causa lesão ao erário, a conduta ilegal do agente público, ativa ou omissa, dolosa ou culposa, no exercício de sua função pública.

Improbidade administrativa, sinônimo jurídico de corrupção e malversação administrativas, exprime o exercício da função pública com desconsideração aos princípios constitucionais expressos e implícitos, que regem a Administração Pública. É mais que mera atuação, desconforme com a singela e fria letra da lei. É conduta denotativa de subversão das finalidades administrativas, seja pelo uso nocivo (ilegal e imoral) do Poder Público, seja pela omissão indevida de atuação funcional, seja pela inobservância dolosa ou culposa das normas legais. Decorre tanto da desonestidade e da deslealdade, quanto da inidoneidade ou da incompetência do agente público no desempenho de suas atividades funcionais. (Marino Pazzaglini Filho. Lei de Improbidade Administrativa Comentada: aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal; legislação e jurisprudência atualizadas. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 18).
O apelante aduz que não houve enriquecimento ilícito nem prejuízo ao erário.
Não merece prosperar tal argumento. Isto porque o prejuízo ao erário é decorrente dos atos irregulares perpetrados, uma vez que a Administração Pública Municipal efetuou o pagamento dos salários dos servidores e não teve em contrapartida, o devido exercício das atividades inerentes ao cargo.
Ao contrário do que assevera o apelante, a má-fé do administrador público restou demonstrada na prática dos atos, uma vez que o Prefeito como representante legal e ordenador de despesas do Município de Maringá, não poderia admitir que os aludidos servidores, supostamente trabalhassem em seu gabinete, quando na verdade seriam lotados em outros órgãos.
Por fim, o recorrente afirma que houve excesso na condenação imposta uma vez que não foi aplicado o princípio da proporcionalidade.
Assiste razão o apelante. No que tange às sanções, cumpre destacar que as penas previstas na Lei de Improbidade, devem ser aplicadas de acordo com o princípio da proporcionalidade. Vale dizer que, o juiz ao aplicar as sanções deve principalmente analisar, à luz do caso concreto, o grau de culpabilidade do agente.
O doutrinador Marcelo Figueiredo, defende que a aplicação isolada ou cumulativa das sanções, dependerá da situação fático-jurídica do caso concreto, in verbis:
“Posicionamo-nos no sentido da ‘liberdade’ do juiz para aplicar as penalidades tal como o caso concreto requer. É dizer, isolada ou cumulativamente, tudo a depender da gravidade do fato, da conduta do agente, de seu passado funcional, da análise do dano e sua extensão etc. As penas podem e devem ser aplicadas isoladamente quando atenderem à sua finalidade. Assim, em determinado caso, apenas a reversão dos bens e multa civil poderão responder à vontade da lei.
Em outra hipótese grave, de comprovado dano doloso do funcionário ao Estado, as penas devem ser cumuladas (algumas ou todas). Deve haver proporcionalidade, adequação e racionalidade na interpretação do diploma, a fim de que não haja injustiças flagrantes” (“Probidade Administrativa – Comentários à Lei 8.429/92 e Legislação Complementar”, 1995, Malheiros Editores, pág. 77)”.
Neste sentido, o Ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 513576, esclarece:
“Reconhecida a ocorrência de fato que tipifica improbidade administrativa, cumpre ao juiz aplicar a correspondente sanção. Para tal efeito, não está obrigado a aplicar cumulativamente todas as penas previstas no art. 12 da Lei 8.429/92, podendo, mediante adequada fundamentação, fixá- las e dosá-las segundo a natureza, a gravidade e as conseqüências da infração, individualizando- as, se for o caso, sob os princípios de direito penal. O que não se compatibiliza com o direito é simplesmente dispensar a aplicação da pena em caso de reconhecida ocorrência da infração.”
Nos casos de improbidade administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, nos julgamentos dos REsp’s. n.ºs 505.068/PR e 300.184/SP, relatados respectivamente pelos Ministros Luiz Fux e Franciulli Netto, estabeleceu alguns parâmetros norteadores para a aplicação do princípio da proporcionalidade, a saber: a lesividade e a reprovabilidade da conduta do agente ímprobo; o elemento volitivo da conduta, ou seja, se o ilícito foi praticado com dolo ou culpa; a consecução do interesse público; a finalidade da norma sancionadora e o histórico funcional do agente.
In casu, verificando as circunstâncias acima mencionadas, constata-se que a condenação nas sanções impostas foram demasiadamente severas.
Silvio Magalhães Barros II foi condenado nas seguintes sanções previstas no art. 12, inciso III da Lei 8429/92: (i) perda da função pública; (ii) suspensão dos direitos políticos por cinco anos; (iii) pagamento de multa civil, arbitrada em dez vezes o valor de seu vencimento; (iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.
Aplicando o princípio da proporcionalidade e tendo em vista as circunstâncias supramencionadas, excluo a sanção de perda da função pública e da proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 anos.
Pelos fundamentos supramencionados, voto pelo parcial provimento do Recurso de apelação de Silvio Magalhães Barros II.

2) RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Primeiramente, afasto a preliminar argüida em contra razões por Silvio Magalhães Barros II, no sentido de que o Ministério Público teria apenas reproduzido os mesmos argumentos exarados na petição inicial.
Isto porque, da leitura do recurso de apelação do Ministério Público, verifica-se que houve impugnação aos termos da sentença, inclusive com o pedido de reforma da sentença, para que Silvio Magalhães Barros II seja condenado ao ressarcimento ao erário.
Assim, não há falar em ofensa ao princípio da dialeticidade.
Quanto ao mérito, o Ministério Público pugna pela inclusão na condenação do ora apelado, do ressarcimento dos valores pagos aos servidores nomeados irregularmente.
Entendo que é devida esta condenação. Isto porque a nomeação dos servidores de forma contrária à lei é ato lesivo que enseja ressarcimento dos danos sofridos.
Não obstante tais servidores tenham trabalhado em outros órgãos da Administração Pública Municipal, é certo que não desenvolveram atividades inerentes aos cargos nos quais foram nomeados. Desta forma, verifica-se que os servidores nomeados receberam por funções que, na verdade, não desempenharam.
Conforme já mencionado neste acórdão, restaram caracterizados danos através dos prejuízos sofridos pelo Município. Destarte, uma vez que houve danos, cumpre a quem deu ensejo aos mesmos ressarci-los, ou seja, o ora recorrido, então Prefeito do Município.
Assim, como consta no parecer da Procuradoria Geral de Justiça (fls.
1907): “o ressarcimento, é medida que se impõe, pois não se pode compactuar com comportamentos ilegais e ímprobos, de forma a isentá-los de ressarcir, ao erário, o que foi por ele despendido em conseqüência de conduta praticada ao arrepio da lei.”
Cumpre destacar que o ressarcimento não implicará em enriquecimento ilícito do município, pois o ora recorrido foi o responsável pelos atos ímprobos e deve indenizar a municipalidade.
Assim, entendo que o recurso do Ministério Público merece ser provido, para que seja incluída na condenação a sanção de ressarcimento dos valores pagos a título de remuneração aos três servidores nomeados irregularmente.
Por tais considerações, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso de Silvio Magalhães Barros II, para excluir da condenação a impossibilidade de contratar com o poder Público, pelo prazo de 03 anos, e a perda da função pública, se ainda a exercer, e dar provimento ao recurso do Ministério Público, para incluir na condenação o ressarcimento dos valores pagos a título de remuneração aos três servidores nomeados irregularmente.
Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em DAR PARCIAL provimento ao recurso de SILVIO MAGALHÃES BARROS II e DAR PROVIMENTO ao recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO.
Participou do julgamento presidido pelo Excelentíssimo Desembargador ABRAHAM LINCOLN CALIXTO (com voto), a Excelentíssima Senhora Desembargadora MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA.

Curitiba, 28 de junho de 2010.
DESª REGINA AFONSO PORTES Relatora

S:\IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA\APELAÇÃO\628546-1 nomeação cargo comissão servidores, improbidade caracterizada, princ proporcionalidade.doc

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