Rio

Jean Boghici: um pioneiro no mercado da arte

Galerista formou, desde os anos 60, um dos mais importantes acervos do país e inspirou outros colecionadores

Pioneiro. Em seu apartamento duplex, Jean Boghici reuniu obras de Modigliani, Lucio Fontana, Rodin, Alexander Calder e dos brasileiros Guignard, Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e Antonio Dias, entre muitos outros
Foto: Leo Pinheiro/29-1-2003 / O Globo
Pioneiro. Em seu apartamento duplex, Jean Boghici reuniu obras de Modigliani, Lucio Fontana, Rodin, Alexander Calder e dos brasileiros Guignard, Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e Antonio Dias, entre muitos outros Foto: Leo Pinheiro/29-1-2003 / O Globo

RIO - Pioneiro no mercado da arte no país, Jean Boghici começou a comprar obras nos anos 1960, quando abriu a galeria Relevo (fechada em 1969). Na esquina da Avenida Nossa Senhora de Copacabana com a Rua Duvivier, o espaço investiu em artistas que já tinham galeria, comprando obras de Alfredo Volpi, Di Cavalcanti, Pancetti e Guignard, mas também apostou nos novos nomes de então, como Antonio Dias, Rubens Gerchman e Wanda Pimentel. A galeria foi cenário de importantes exposições, como a coletiva da Escola de Paris, em 1964, que mais tarde deu origem à histórica mostra “Opinião 65”, no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio.

Desde então, Boghici já unia duas funções: colecionador e marchand. Foi ele o responsável pelo gosto dos mais importantes colecionadores do país, como Sérgio Fadel, Luiz Antonio de Almeida Braga e Gilberto Chateaubriand — este, lembram os amigos, costuma dizer que Boghici é o “pai” de sua coleção.

O apartamento duplex na Rua Barata Ribeiro, onde o colecionador vive com a mulher, Geneviève, guarda os tesouros de seu acervo, que também ocupa parte da galeria que leva seu nome, em Ipanema. Da obra-prima de Di Cavalcanti “Samba” (1925), uma das mais importantes da história da arte brasileira, a telas viscerais de Antonio Dias dos anos 1960, a coleção de Boghici é considerada uma das mais importantes do século XX no país. Seu acervo de pinturas internacionais também tem nomes de destaque, como Lucio Fontana e Modigliani. Ele também possui móbiles de Alexander Calder e obras de Rodin.

Planos para Museu no Porto

Organizador da exposição inaugural do Museu de Arte do Rio, o MAR, na Zona Portuária, Leonel Kaz usaria 180 obras da coleção de Boghici para preencher o terceiro andar da instituição, cuja inauguração está prevista para setembro. Um catálogo com 250 páginas e imagens do acervo do colecionador será publicado pela editora Aprazível na ocasião da mostra.

— É uma realidade dramática, mas posso afirmar: se esse incêndio tiver grandes proporções, a arte brasileira terá sofrido golpe tão ou maior do que aquele vivido no incêndio do MAM — diz Leonel Kaz, referindo-se ao acidente no museu carioca nos anos 1970, que deteriorou boa parte do acervo da instituição.

Boghici foi namorado de Lygia Clark, e, em textos, ela credita a ele a ideia de usar dobradiças em seus célebres “bichos”. Foram elas que fizeram as obras serem maleáveis. Nascido na Romênia em 1928, Boghici, que estudou engenharia, mudou-se para Paris, onde dividiu apartamento com o secretário do escultor romeno Constantin Brancusi, outro dos principais nomes da história da arte.

Em 1949, Boghici veio para o Brasil e dormiu algumas noites na Praia de Copacabana até ir para Belo Horizonte, onde conheceu Guignard (1896-1962). Dele, Boghici possui obras fundamentais como “Floresta tropical” (1938). O colecionador e marchand é dono ainda de “Sol poente” (1929), de Tarsila do Amaral.

— Jean é de uma importância incrível para a arte brasileira. Sempre generoso e parceiro das instituições. Se o acervo foi danificado, é uma perda inestimável, pois se trata de um dos mais importantes e expressivos do país — diz Carlos Alberto Gouvêa Chetaubriand, presidente do MAM e filho do Gilberto Chateubriand.