10/01/2013 18h46 - Atualizado em 10/01/2013 18h48

Para artistas, chileno Selarón fez história na arte de rua

'Ele mostrou que se pode fazer arte em qualquer lugar', diz músico.
Cineasta afirma que ex-colaborador de Selarón era ‘esquisito’.

Carolina LaurianoDo G1 Rio

Desenhos de Selarón foram usados em animação de documentário sobre vida do artista (Foto: Reprodução / Documentário 'Selarón' / Divulgação)Desenhos de Selarón foram usados em animação de
documentário sobre vida do artista (Foto: Reprodução
/ Documentário 'Selarón' / Divulgação)

A morte do artista plástico chileno Jorge Selarón, autor da famosa escadaria na Lapa, no Centro do Rio, foi lamentada por diversos artistas nesta quinta-feira (10). Ele foi encontrado carbonizado nos degraus do local que ele ajudou a transformar em ponto turístico do Rio através da instalação de um mosaico de azulejos coloridos.

A Divisão de Homicídios está à procura de Paulo Sérgio Rabello, ex-colaborador do atelier de Selarón. Em novembro do ano passado, o artista denunciou à polícia que vinha sofrendo ameaças de Paulo Sérgio, que exigia os rendimentos das vendas de quadros do artista.

O cineasta Stéphano Loyo foi um dos que registraram a vida do artista no documentário “Selarón”. Além de ser um dos registros mais longos, há animações de desenhos feitos pelo próprio chileno. Segundo Stéphano, o assistente de Sélaron, Cesar Gomes, o telefonou no fim de 2012, para falar das ameaças que o artista sofria e também da depressão. Cesar pediu para que o cineasta ajudasse a fazer um site com as obras dele. “Acabou que não conseguimos nos encontrar. Acabei adiando isso e agora fico triste de não ter podido ajudar”, lamenta.

Para o Stéphano, Paulo era uma pessoa “esquisita”.  “Esse Paulo sempre foi uma pessoa esquisita, era enciumado com a intimidade que eu tinha com o Selarón. É tudo muito chocante par mim”, disse Stéphano. “Ele era um grande personagem, ele era apaixonado pelo que fazia, eu decidi fazer o documentário porque eu já conhecia e já era encantado não só pela obra, mas também pela pessoa”, lembrou.

O secretário de Patrimônio da Prefeitura do Rio, Washington Farjado, afirmou que pretende ir ao ateliê do artista para registrar como a escadaria está hoje, para que não seja descaracterizada. Para ele, a obra deixa de ser viva, já que Selarón sempre a modificava, porém ela se torna eterna. “Muito triste, pegou todo mundo de surpresa, porque foi um artista que tinha muita coisa para produzir. A partir da arte, sozinho, ele trouxe beleza para aquele lugar, um lugar que era comum, banal, virou especial. Isso é um aprendizado. Uma pessoa é capaz de transformar um lugar que vive, é capaz de cuidar. A escadaria era uma obra viva, ele estava sempre modificando, é um dia muito triste para a Lapa e para o Rio de Janeiro”, disse.

Obra tombada
Dez anos depois de ter sido iniciada, a escadaria foi tombada pela prefeitura do Rio em 2005, pelo então prefeito César Maia. Selarón recebeu o título de cidadão honorário do Rio de Janeiro. O que originou a obra foi a decoração para a Copa do Mundo de 1994. Os mais de 200 degraus receberam azulejos coloridos, vindos de dezenas de países. Vale ressaltar que o artista viajou por mais de 50 países até se estabelecer no Brasil. De lá para cá, os mosaicos eram trocados por azulejos de fãs nacionais e internacionais.

Artista de escadaria na Lapa, Selarón é encontrado morto  (Foto: Renata Soares/G1)Artista de escadaria na Lapa, Selarón é encontrado
morto (Foto: Renata Soares/G1)

Uma obra semelhante, também com mosaicos em escadaria, foi feita na subida do Morro do Preventório, em Charitas, em Niterói, na Região Metropolitana do Rio. A diferença é que o trabalho de Selarón é individual. Em Niterói, a produção foi coletiva, feita por mais de 100 pessoas. Para a coordenadora do projeto, Leila Barboza, Selarón deixou um grande aprendizado para a arte urbana. “Uma coisa importante dessa história é como a cidade conseguiu colocar a arte pública em local de prestígio e como a cidade de Niterói conseguiu fazer o inverso com uma obra. Aqui a escada é esquecida, uma produção premiada pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), pela Secretaria de Cultura do Estado, mas nunca levou nenhuma menção da prefeitura. A morte do Selarón me fez lembrar dessa importância que o trabalho dele teve e essa história que ele fez no Rio, teve reconhecimento do poder público”, explicou Leila.

O movimento paulista Artistas na Rua prestou uma homenagem ao artista nas redes sociais. O grupo, que surgiu após um período de repressão a artistas de rua, luta por uma lei que libere espaços públicos para qualquer manifestação artística.  “Ele é a expressão do artista de rua, porque as pessoas podem ver e respeitar. O movimento não quer só proteger o artista de rua, ele quer levar o artista para rua, para as pessoas se sentirem tocadas pela arte. Ele não era brasileiro, porque a arte não tem território, mas ele, através da manifestação na rua, naquele espaço, ele trouxe notoriedade e trouxe conhecimento para o povo. Ele mostrou que se pode fazer arte em qualquer lugar, no meio da escada, ele é um símbolo de manifestação livre”, afirmou o integrante do grupo e músico James Lima.

A morte de Selarón correu o mundo. Os sites da BBC News, The Guardian, La Nación e dezenas de outros jornais internacionais repercutiram a morte do artista plástico. No Twitter, muitos manifestaram pesar com a morte do chileno. O apresentador Marcelo Tas disse “O Rio fica mais triste e injusto”.

O artista plástico chileno Jorge Selarón, de 65 anos, em foto de 2003 (Foto: Marcos Ramos / Agência O Globo)O artista plástico chileno Jorge Selarón, de 65 anos, em foto de 2003 (Foto: Marcos Ramos / Agência O Globo)

Corpo carbonizado
O corpo de Selarón foi encontrado próximo aos degraus, em frente à casa onde o artista morava há mais de 30 anos. Ao lado de Selarón, a polícia encontrou uma lata de solvente.

Jorge Selarón começou a obra na escadaria que liga Santa Teresa à Lapa na década de 90. O local se tornou ponto turístico do Rio com a ida de visitantes brasileiros e de vários países, que se encantavam com os azulejos coloridos.  O artista costumava vender seus quadros no próprio local, chamado de Escadaria do Selarón.

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